segunda-feira, 18 de outubro de 2021

Daquele dia no abismo

Uma pessoa importante me disse que eu deveria aproveitar melhor a brisa fresca que toca meu rosto. Admito que, quando ouvi, não prestei a devida atenção mas, agora, percebo que, até no meio da tempestade é possível admirar alguma beleza. É um conselho de aproveitar as pequenas alegrias, mesmo que todo o resto esteja um caos. 

De certa forma é preocupante ver como muitos vivem sem perceber os problemas ao seu redor porque só focam nas pequenas alegrias, e falo das pessoas que parecem viver numa eterna festa mas, por outro lado, quando só se vê as coisas horríveis dessa existência, prestar atenção na pequena brisa do bater de asas de uma borboleta pode salvar uma vida. 

Tive uma crise complicada ontem, que resultou no último texto que publiquei e que, na realidade, tinha sido enviado à minha mãe, que prontamente entrou em pânico. Estava pronto pra naquele momento tomar uma quantidade letal de meus remédios, me despedir finalmente desse mundo mas hoje, passado aquela tormenta, todo aquele desespero, daquelas lágrimas, eu sinto uma brisa leve, sentado aqui na sala, e me sinto bem. 

O corpo cansado (crises sempre me deixam exausto e ainda tive atividade na igreja à noite e hoje a manhã toda) mas estranhamente tranquilo, uma tranquilidade que há muito eu não sentia e, principalmente, que eu achei que nunca mais ia sentir. Ontem, enquanto era engolido pelo abismo, eu achava que nunca poderia sentir nada parecido com tranquilidade, minha alma estava inquieta depois da notícia de que serei obrigado a me mudar novamente e, possivelmente, voltar para uma casa em que morei tempos atrás, um lugar inóspito e cheio de brigas que eu sinceramente não posso suportar. A perspectiva desse retorno foi o estopim pra uma crise que já se prenunciava durante todo o dia. Foi horrível, e eu nem consigo descrever o quão desesperador foi. 

Foi um assomo de trevas, como se meu coração fosse tomado pela escuridão, eu não via mais nada, só a destruição diante de meus olhos, a lembrança das discussões, o medo que eu sentia naquelas paredes descascadas pelo mofo. Foi como ser engolido pelo oceano, a torrente invencível, colossal me levando para o fundo, nenhuma luz, nenhuma mão por perto, a voz da minha mãe distante, sumindo assim como sumia a claridade da superfície. 

O abismo era frio e escuro, senti congelar a carne, cada fibra até o tutano, e olhava desesperado ao meu redor buscando ajuda. Mas naquele abismo não havia nada, e o nada era tudo que eu passei a sentir até acordar desse pesadelo, até sentir a brisa fresca no meu rosto...

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