sexta-feira, 29 de outubro de 2021

Efeitos e Festas

Sentei-me de frente ao computador várias vezes, 
abri e fechei a página em branco, 
o interior inquieto, 
imagens que não consigo transformar em palavras 
mas todas querem sair de algum modo. 

Um grito abafado num dia quente, 
de tédio, 
de leituras que eu não terminei, 
de festas que eu não quero ir 
e de músicas que eu não consigo cantar. 

Minha menta vaga, 
meu corpo definha no calor, 
rolando na cama incomodado 
com cada peça de roupa. 
Minhas pernas tremem.

Ansiedade? 
O efeito dos antidepressivos me dando uma energia que desconheço? 
É caótica 
mas não é a aquela energia maligna, 
primitiva, 
animalesca, 
é apenas uma força que passa pelo meu corpo. 

E talvez por isso eu não consiga dizer, 
porque não há nada a ser dito, 
há apenas força para viver? 

X

Mas eu ainda não quero ir naquela festa, mesmo sabendo que pode haver um ou dois meninos bonitos, eu não quero falar com eles. Na verdade eu não quero falar com ninguém mais, não quero que ninguém mais entre nos recessos da minha mente e tenha o poder de me desestabilizar. Mas eu sei que preciso de novos amigos, preciso conhecer gente nova, mas essa perspectiva ataca o meu pânico social: até a ideia de sair com alguém me deixa em estado de alerta, como se fosse sofrer um ataque terrorista. E eu exagero até em não querer sentir nada, exagero nas vírgulas, nas reticências, nos melindres. 

Exagero nas preocupações, no pensar em problemas que não posso resolver, em pensar num futuro que não posso controlar de modo algum afinal meu poder sobre qualquer coisa desse mundo infindável é extremamente limitado e o que posso fazer é nada, comparado com a vastidão de coisas que esse mundo pode oferecer ou usar para me destruir. Exagero em prestar atenção nessas coisas, tão grandes e tão pequenas, capazes de doar e de tirar a vida. Exagero em dizer que a morte nos acompanha durante toda a vida e que fica a espreita? Isso, penso, já não é um exagero.

A pele envelhece e racha como o leito do rio seco, o cabelo perde a cor, as forças se esvaem ano após ano. Ser jovem e observar a própria morte é aterrador. Se a virem por aí, diga para que se apresse, mas eu sei que ela vai se demorar, ainda há muito que me fazer sofrer, ainda há muito que me fazer chorar de desespero pelo amanhã. Ela não deixaria que eu desistisse tão fácil assim. E eu exagero em dizer isso pois, na realidade, como para todos os homens o universo, e portando a morte, é absolutamente indiferente a mim e meus desejos. 

E agora, com o corpo cansado da festa que eu não queria ir, e o coração quente por falar com uma pessoa que eu não queria conhecer, eu vou dormir, com um sentimento misto de pânico e desejo ardente pelo próximo dia, por estar vivo mais um dia, por estar um dia mais próximo da morte, por (será?) ter mais uma oportunidade de me apaixonar. 

E eu nem pretendia soar demasiado dramático assim, apenas fluiu, e foi assim. 

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