Eu não quero mais falar sobre essas coisas, sempre as mesmas coisas. Não quero falar do medo que me assombra todas as noites, não quero falar de como me sinto sozinho e incompreendido, não quero falar de como não encontro nenhum significado na minha vida. Não quero falar disso.
Mas é o que há no meu coração, é o que tem me afligido e, por isso, é só o que tenho a dizer. Infelizmente a minha experiência humana se limita a essas breves realidades de dor e sofrimento, pequenos se comparados com a dor e o sofrimento de tantos, mas ainda assim são a minha dor e o meu sofrimento, é o meu sangue derramado. Por isso eu não consigo falar sobre outra coisa, pois conquanto escrevo me derramando completamente, é o meu sangue que pinta essas letras, gota a gota.
E cada uma dessas gotas contém minha experiência, elas dão testemunho do imenso vazio que me consome, dos dias parados e das noites tenebrosas, dos anseios e dos pavores que me derrotam dia após dia, que me reduzem a cinzas, dos meus renascimentos e de volta as cinzas, num ciclo interminável, na roda do destino que nunca para de girar.
E a roda da fortuna começa a girar novamente, eu sou lançado a um dos reinos de existência, e cruzarei todas as seis existências em um dia, sendo deus, sendo demônio, sendo homem, sendo animal, sendo fantasma, num inferno.
Experimento todas as existências, abomino o destino de estar preso a essa roda de sofrimento como abomino a minha aparência de besta no espelho, como abomino os meus apetites animalescos mais baixos, como abomino as guerras intermináveis que me destroem cada dia mais, destruindo até o átomo, não deixando nada, e a cada novo dia eu renasço para morrer novamente, depois de cada existência. E cada uma delas é uma gota no ser, apenas uma gota no imenso oceano desconhecido do ser.
Onde estarão os devas para me resgatar? Mas de que adianta se lá eu posso tornar a cair em qualquer um dos reinos novamente? Não há patrono que me possa resgatar. E eu, pobre, que farei, a quem invocarei quando tudo já foi chamado a juízo e o justo Rei já decidiu o meu castigo, que parece ser a eterna repetição dos meus ciclos?
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