quarta-feira, 2 de fevereiro de 2022

Melancolia


De repente me veio a falta de alguém, alguém que me abraçasse, que me tocasse com delicadeza, que me beijasse a testa como a brisa do mar beija meu rosto. Alguém que segurasse firme a minha mão, afastando os demônios que me cercam e me deixando consciente da minha própria presença, não querendo afastar a presença do ser como agora. Alguém que me ame, de verdade, que não me apunhale pelas costas na primeira oportunidade. Alguém que correspondesse ao meu coração ardente. De repente me vem essa falta de alguém e às vezes ela fica, e se instala no meu peito e cresce como uma erva daninha, me sufocando, me apertando, aos poucos me matando de vontade de ter alguém. 

E essa vontade, que vai crescendo cada vez mais, transborda em lágrimas, na constatação de eu estou absolutamente sozinho nesse quarto escuro e que nada pode afastar os demônios que me cercam. Esse medo de que eles me matem me dói, essa constatação da minha solidão me dói, dói de verdade, dói aqui fora e não só como figura de linguagem. Ser triste e sozinho dói.

De repente veio ela, a melancolia.

E eu vejo que há sabedoria nessa melancolia, os antigos gregos já tinham percebido isso, não é um mérito meu, mas ela vem acompanhada dar dor que é carregar essa sabedoria. É como se eu pudesse ver mais, com efeito muitas vezes eu sinto que vejo mais do que outros conseguem, que vejo de modo mais amplo, mais cru, mas ao mesmo tempo isso tem um custo: sacrificar a própria felicidade. Ver as coisas como elas são, por mais que eu fuja disso, é dolorido. Ver a verdade é desistir da felicidade. A vida não passa de uma sombra ambulante, dizia Macbeth (eu acho). E o melancólico é aquele que dar-se conta dessa sombra. Enquanto os outros olham para si mesmo o melancólico olha também pra baixo e vê sombra. O problema da melancolia é que ela paralisa. Ela nos impede de ir adiante. Eu olho pra mim e vejo potencial, mas um potencial desperdiçado em cima de uma cama. Essa é a minha sombra. 

E fico na sombra, sozinho, desejando que alguém pudesse vê-la comigo. 

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