sábado, 27 de agosto de 2022

Recomeçar

Hoje foi mais um dia atípico por aqui. Ainda estamos de acampados na casa da minha prima mas começamos a maratona de olhar casas pra alugar. Depois de semanas olhando casas online nós escolhemos algumas e fomos visitar. Uma muito longe, outra muito distante, a outra um pouco pequena, outra a imobiliária exigia muita documentação, enfim, foi um dia longo. Quando a gente já estava bem cansado de andar por metade da cidade, sem exagero, resolvemos ir numa casa que minha prima tinha visitado semanas atrás e que havíamos descartado por ser muito pequena. E nesse meio tempo o caminhão chegou com a mudança e inclusive chegamos a tirar algumas coisas dele. 

Fomos até a tal casa, eu já sem muita esperança e só querendo fechar qualquer negócio pra não precisar descarregar a mudança inteira aqui e depois levar pra outro lugar. Surpreendentemente todos gostaram da casa, que fica na parte de cima de um sobrado, e acabamos por fechar negócio. Na verdade não foi tão simples já que uma pessoa estava na fila para alugar antes mas, felizmente pra gente, o locatário logo ligou e disse que poderíamos ficar com a casa. 

A sensação de alívio foi grande, mesmo sabendo que por conta da disposição dos móveis no caminhão a gente ainda vai ter de descarregar tudo aqui, separar as nossas coisas das da minha tia e só depois levar as nossas coisas pra lá, já é uma tranquilidade maior saber que não precisamos mais nos preocupar em procurar um lugar pra ficar. Isso já é o começo de uma tão esperada reestruturação, já que tendo uma casa podemos saber onde procurar trabalho, podemos nos estabelecer antes de realmente conhecer o lugar. É realmente um alívio.

Bom, enquanto o cansaço continua batendo forte esses dias as coisas estão um pouco menos divagantes, o objetivismo é um efeito da sensação de urgência e isso é um bom sinal: não me perder em palavras demais talvez signifique que a realidade está sendo mais importante do que o subjetivismo um tanto exagerado de sempre que tantas vezes parece me cegar, como por exemplo nos últimos dias em que deixei me levar pela insegurança ao invés de confiar na Providência. 

X

As almas que caminham na luz cantam cânticos de luz; as que caminham nas trevas cantam o cântico das trevas. Deixai cantar umas e às outras , até ao fim, a parte e o motete que Deus lhes destina. Quando é Deus a encher a alma nada temos nós que ajuntar, mas deixar correr as gotas desse fel das amarguras divinas. Assim faziam os profetas Jeremias e Ezequiel: todas as lágrimas não eram senão gemidos e suspiros, só encontrando consolação nesses continuados lamentos. Quem tivesse detido o curso dessas lágrimas, ter-nos-ia privado de alguns dos trechos mais belos das Sagradas Escrituras. Só o espírito que produz desolação é capaz de dar consolação: são águas diferentes, mas que brotam da mesma nascente divina. 

Quando Deus atemoriza uma alma, ela treme; quando a ameaça, ela sente-se tomada de pavor. Deixai desenvolver-se a operação divina, que em toda a sua extensão traz consigo o mal e o remédio. Chorai, queridas almas, tremei na vossa inquietação e agonia; não façais esforços para mudar esses divinos temores e esses celestes gemidos. No fundo do vosso ser recebei os riachos desse mar que inundou a alma santa de Jesus. Ide sempre para diante, semeando lágrimas, enquanto o sopro da graça as fizer correr; e insensivelmente o mesmo sopro as fará secar. As nuvens dissipar-se-ão, o sol voltará a espalhar a sua luz, a primavera cobrir-vos-á de flores, e na sequência do vosso abandono encontrareis a admirável variedade, produzida pela ação divina em toda a sua extensão. (Jean-Pierre de Caussade, O Abandono à Providência Divina)

X

Hoje foi mais um dia exaustivo. O volume de coisas na mudança é absurdo e todos estávamos extremamente cansados quando acabamos, e isso porque levamos um dia inteiro carregando as coisas. Depois de tudo colocado mais ou menos dentro de casa, e muita coisa ainda do lado de fora, nós finalmente conseguimos começar a organizar um pouco. É um trabalho demorado, tirar as coisas das caixas, limpar, ver se ficam bem num lugar, tentar colocar em outro, mas aos poucos as coisas vão se ajeitando.

Infelizmente eu não consegui ajudar muito, meu corpo simplesmente chegou no limite, eu sentei e não conseguia mais levantar, não conseguia nem falar direito, e então eu precisei de uma pausa. Não pude ser útil e isso é tudo.

Cheguei naquela fase da mudança que o cansaço e a fadiga cobram uma taxa do meu corpo e eu simplesmente desligo. Amanhã provavelmente vou conseguir acordar com mais disposição e ai sim começar a colocar as coisas no lugar onde elas vão ficar. Pouco a pouco a casa vai ganhando forma, assim também a mente vai se organizando e colocando um pouco mais de ordem nesses dias caóticos. 

X

Consegui, como disse, acordar com mais ânimo e agora sim consigo ver o resultado do esforço da última semana. Os cômodos já estão mais ou menos como deverão ficar e já começamos aqueles ajustes que nos permitirão arrumas os pequenos detalhes quando o grosso dos móveis e objetos já estiverem onde devem estar. Essa parte é reconfortante, sentar cansado agora num fim de tarde, com a brisa fresca do mar entrando pela janela, e olhar pro esforço de dias e de várias pessoas e ver que as coisas estão tomando seu lugar. 

Meus livros foram acomodados nas estantes, quase tudo no meu armário está no devido lugar (o mais próximo possível de como estava na outra casa), a internet foi instalada e a televisão e o home theater também, o que significa que essa noite eu já poderei assistir meus BLs na casa nova e não apenas na tela do computador com fone. Isso já é sinal de que as coisas estão caminhando e, embora cansado, eu estou feliz e otimista com tudo isso. Agora não adianta mais o temor de antes, já passou, ficou algumas centenas de quilômetros para trás, preciso agora ver o sol daqui como um novo sol, que voltou a brilhar depois de longas trevas. Até consegui brincar com a situação, dizendo que agora eu sou finalmente uma gay chão de taco morando numa ilha. É, isso é uma coisa boa. Finalmente recomeçar. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário