terça-feira, 22 de novembro de 2016

A Porta da Verdade

Sinto como se mais uma vez caminhasse nos tribunais de minha própria condenação. Mas este é um tribunal diferente, não há nele nenhuma possibilidade de absolvição. Pois neste tribunal eu não serei levado à força para responder por um crime que cometi, eu mesmo a ele me dirijo, e eu mesmo serei aquele a proferir a sentença final. 

Não sou inocente. Não poderei dizer que fiz sem saber. Não poderei dizer que não sabia do que estava fazendo. Eu sabia, sabia e fingia não saber. Fingi entrar por uma sala escura sem saber o que havia lá dentro. Fingia estar curioso com os mistérios que se escondiam por detrás daquela porta, e eu a abri. A empurrei com força. Mas eu já sabia bem o que se encontrava do outro lado. Do outro lado da porta se encontrava a verdade.

A verdade.

A verdade é fria e real. É dura como um bloco de concreto e esmaga a todos que contra ela se chocam. A verdade é firme e se impõe contra qualquer corpo frágil, e apenas se abala contra aqueles que são mais sólidos do que ela. Mas no meu caso, eu não sou de forma alguma mais forte que a verdade, pelo contrário, eu sou aquele corpo frágil e mole que cai disforme ao chão depois de se chocar com a rocha da verdade. 

Dizem que ao primeiro contato com a verdade, não há mais como fechar os olhos a ela. Minto, não sei se alguém diz isso mesmo, acabei de inventar, mas é uma verdade que trago comigo. Mas mesmo que não possa fechar os olhos a ela, eu posso correr e me esconder. 

E foi o que eu fiz.

Corri, corri e me escondi. 

Entrei por uma porta que parecia forte o suficiente para me esconder de todos os meus medos. Uma porta que parecia esconder atrás de si a resposta para as minhas perguntas. Essa porta parecia poder esconder aquilo que eu tanto buscava. E embora ela fosse para mim completamente nova, ao mesmo tempo eu senti que ela sempre estivera ali, escondendo atrás de si a verdade.

Como um jovem ingênuo e curioso eu a empurrei com força. E quando ela se fechou atrás de mim, eu pude enxergar o que de fato se escondia atrás dela. E o que me aguardava por toda a eternidade.

Eu estava enganado.

Atrás daquela porta não estava o amor que eu procurava.

Estava apenas a mesa onde seria torturado por todo o sempre pelos fantasmas que criei dentro de mim na busca incessante por uma verdade que não era a verdadeira verdade. A verdade se enfureceu com meu desvario e me condenou a eterna condenação.

Os meus gritos seriam a única coisa a sair por aquela porta, para que todos pudessem ouvir o que acontecia com aqueles que se recusavam a encarar a verdade como ela é e tentavam criar uma nova verdade.

A verdade não pode ser mudada, nem recriada. 

A verdade é apenas uma, única, imutável.

A verdade dói.

E as vezes a verdade dói tanto que sentimos como se ela nos torturasse para que aprendêssemos a reconhecê-la e a aceitá-la. Na verdade essa tortura é apenas ela marcando fundo em nossa pele a sua verdade. Como se quisesse impedir que ela fosse esquecida. 

Para se marcar profundamente em nossa alma, a verdade se usa de três procedimentos, a compreensão, onde temos o primeiro contato com ela. A destruição, onde ela nos tortura até que nossa alma esteja bem afinada com sua verdade e por fim, a recomposição, onde ela reconstrói a carne destruída de uma forma nova, uma forma verdadeira.

Essas duas últimas fases, a decomposição e a recomposição são duas faces de um mesmo fenômeno: o do conhecimento da verdade. 

Ela destrói mentiras que nos pareciam verdades, e constrói a verdade de uma forma sólida em nossa consciência. Esse processo, por ser doloroso, é temido, mas necessário.

Não sei ainda se entrei pela porta certa. Se a destruição que tenho sentido é fruto da verdade ou de minhas ilusões, mas a certeza que tenho é que ao final dela eu serei reconstruído. Seja como um homem melhor ou como um cadáver. Mas a verdade não passa sem deixar uma marca. 

Mas não sei ainda se entrei pela porta certa.

Essa porta me levou a escuridão total. Ao frio, a dor. 

Essa é mesmo a porta da verdade? 

Aqui eu não encontrei respostas. 

Não encontrei nada além de sofrimento. 

Não encontrei nada além da verdade sorrindo para mim satisfeita com minha dor e meu sofrimento.

E não consigo mais voltar também. Acho que estou aqui, preso nessa escuridão de desamor para todo o sempre a pensar...

A pensar em como é do outro lado da porta da verdade, onde o amor é real e não um conceito abstrato e distante, inalcançável para simples homens como eu. 

Um dia quem sabe eu consiga passar pela porta da verdade...

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