quarta-feira, 30 de agosto de 2017

Noite de névoa

Ontem me veio uma súbita impressão em meu coração, que logo se transformou em necessidade. Senti que precisava sumir, não por estar cansado, mas porque precisava fugir de algo ruim que iria me acontecer. Precisava me esconder de algo que viria ao meu encontro apenas para me destruir, e por isso eu precisava correr.

Foi aí então que tive a ideia de dormir, o que seria fácil com a ajuda de um bom e velho rivotril. E assim eu fiz. Momentos depois eu comecei a notar que meus sentidos estavam se tornando anuviados. Minha mente e olhar se tornaram pesados, meu corpo não queria mais se mover e tudo o que lhe dava prazer era o conforto que a imobilidade poderia me oferecer.

Fui sentindo aquele torpor me dominando, e o permiti, e aos poucos foi como se meu corpo fosse envolvido por uma névoa densa, espessa, que começou por tirar os movimentos das extremidades de meu corpo, e depois seguindo até que chegasse ao coração e depois a minha mente, quando adormeci totalmente.

Não me recordo de ter sonhado, apenas lembro que acordei uma ou duas vezes para logo voltar a dormir, quando alguém acendeu as luzes da cozinha e deixou algo cair ao chão. Acho que quebrou, mas não tive forças para levantar e ver o que era. Tampouco tive forças para arrumar a cama ou me trocar, acabei dormindo de jeans e a camiseta que estava, de tecido desconfortável. Ao meu lado ainda estavam algumas coisas que deveria ter usado mais cedo, como um hidratante e o celular. 

Celular este que felizmente permaneceu em silêncio durante toda a noite. Se fosse em outra ocasião, provavelmente teria me sentido chateado com o fato de ninguém ter se lembrado de mim, mas não hoje, fiquei feliz de não ter sido incomodado por ninguém, e assim ter conseguido me ausentar completamente desse mundo.

Eu adormeci pesadamente por horas, me deitei ontem por volta das 19h e acordei hoje ao meio dia, com os olhos ainda pesados, a face e os lábios bastante inchados, mas tranquilo, quase feliz. Minha mente ainda não conseguiu se recuperar completamente e eu nem sequer consegui estudar. Passei rapidamente a vista sobre alguns textos que deveria ler mas em nenhum deles eu consegui me deter, e então percebi que não adiantaria me forçar, não conseguirei estudar hoje.

Em mim agora habita uma sensação estranha. Me sinto em partes mais calmo, em vista da apreensão que senti ontem antes de dormir, e nem sequer consegui ainda entender o que me levou a sentir aquilo. Por outro lado eu sinto um volumoso número de impressões se ajuntando no meu interior. É como se sentisse algumas pessoas me chamando, e consigo identificar cada uma de suas vozes, mas não tenho forças para responder de volta. Não, não é bem isso.

Eu sei bem que nenhuma delas está a me chamar, do contrário de fato me chamariam, o que estou a ouvir não é nada mais senão a minha própria carência, buscando ser aceita e amada. E por esse motivo é que o meu corpo quer e não quer responder ao mesmo tempo. Daí a sensação de que falei, que nada mais é do que o reflexo da batalha interior que agora se dá em meu coração. 

Voltarei então ao estado de torpor novamente, pois não quero dar ao destino a graça de se divertir com os meus desmandos, indo atrás de quem sei que não pensa em mim. Melhor voltar ao meu esconderijo de névoa, onde ninguém mais pode entrar, do que me arriscar a caminhar pelos agrestes escarpados e desconhecidos do mundo que tanta decepção me trouxe.

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