quarta-feira, 9 de agosto de 2017

O Rei Eterno

Num campo deserto um homem caminha só, sem saber em que direção está ou aonde irá chegar. Ao olharmos de longe vemos apenas uma mancha em meio a luz escaldante do sol que de tão brilhante torna os homens cegos. O viajante se abriga embaixo de pesadas vestes, e uma capa longa voa ao vento, assim como a areia que rodopia violentamente ao seu redor.

Qualquer um poderia pensar trata-se de um moribundo, um homem sem importância que anda sem direção esperando apenas a hora de sua morte chegar. Caminhando apenas para dar a si mesmo a impressão de continuar lutando até o dia em que sua capa será trocada pelo manto negro da morte. Mas este homem não é um rejeitado da sociedade, mas um rei que, desejando a vida eterna, aprendeu da pior maneira que nossos desejos nem sempre são aquilo que realmente precisamos.

Ele caminhou por anos, em busca de vida eterna, de um corpo perfeito e imortal, e não descansou nem mesmo quando sua alma deixou seu corpo. No inferno ele continuou sua busca incansável até que depois de longos séculos de tortura, conseguiu dos deuses o direito a um corpo imortal, como recompensa por sua longa jornada. O que ele não sabia é que os deuses não tinham intenção de com aquele corpo o presentear, mas apenas castigá-lo por almejar algo negado aos homens. Apenas aos deuses está reservado o direito a um corpo imortal, pois vivem rodeados de todas as riquezas e prazeres do mundo, enquanto usam de seus poderes para governar o mundo, que está sempre a mudar. Mas ao pobre rei não, ele não era um deus, não tinha o que governar, e quando retornou a este mundo, sei reino já havia se acabado, e ele não era mais lembrado, temido e nem reverenciado por ninguém. Seu nome foi esquecido pelos homens pelos quais um dia ele lutou, seu povo aprisionado e suas mulheres vendidas aos reinos vizinhos.

Recuperara seu corpo, e sua vitalidade, e por um século ou dois fora admirado aqui e ali como grande líder e guerreiro, mas ele logo aprendeu que viver para sempre num mundo onde todos morrem significa ser eternamente esquecido por uns, enquanto precisa recordar aos outros o valor de sua existência.

Não acostumou-se a ver os seus morrendo, ano após ano, e ter de superar o luto, ano após ano, em todos os lugares que estivera. Os deuses deram-lhe um corpo perfeito, que nunca apodreceria, mas mantiveram seu coração humano, fraco, que se apega, que ama, e que sofre com a perda.

Não ganhou a vida eterna, uma vida de deleites e prazeres, uma extensão das conquistas que tivera em vida. Ganhou dor, desespero, e a eterna condenação de ver os seus morrendo, dia após dia, até o fim dos tempos e além... Caminha agora sem rumo, sem direção, apenas fugindo em sua loucura do mundo em que vivera por milênios, e que por milênios vira morrer em seus braços, não uma ou duas, mas incontáveis vezes.

Caminha agora sem rumo, tentando encontrar a morte que para sempre lhe foi tirada. Deseja agora fazer parte do grande número de condenados a morte desse mundo, deseja não mais ser o rei dono de todos os tesouros da terra, mas possuir a morte para si. Deseja não ver ninguém morrendo em suas mãos, mas sabe que o mundo há de morrer, enquanto ele viverá eternamente.

Morrendo a cada dia, mas sem nunca conseguir morrer. Vivendo cada dia tendo de encarar a morte, mas sem nunca poder tocá-la, sem nunca poder acompanha-la ao seu reino. 

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