domingo, 10 de setembro de 2017

A Correção Fraterna - 23° Domingo do Tempo Comum (Ano A)

Santo Afonso de Ligório, defensor da moral cristã
"Se teu irmão tiver pecado contra ti, vai e repreende-o entre ti e ele somente; se te ouvir, terás ganho teu irmão." (Mt 18, 15)

Não costumo fazer muitas reflexões bíblicas, cotidianamente, não por não saber ou não conseguir, mas porque simplesmente não tenho muita afinidade com o gênero exegético em questão, logo, evito me adentrar a dizer algo num campo que por não dominar acabaria por dizer asneiras, como o fazem todos os que acreditam que qualquer interpretação supostamente inspirada pelo Espírito Santo, quando na verdade se trata apenas de sugestão, é válida. Prefiro deixar que os santos as façam,como tantos o fizeram, ou que ao menos os devidamente preparados as conduzam.

Dito isto, gostaria de me debruçar um pouquinho acerca das leituras que a liturgia deste 23° Domingo do Tempo Comum nos oferece como ponto de partida para uma correta conversão, nossa e de nossos irmãos. 

O Evangelho de hoje (Mt 18, 15-20) é continuação daquele da Parábola da Ovelha Perdida, e pode ser visto como uma forma concreta do ensinamento daquele. Em resumo, trata-se da correção fraterna, a qual infelizmente nos dias de hoje vem sido negligenciada em função de um relativismo que adentrou com força no seio da Igreja e no coração dos seus fiéis. Teoricamente a correção fraterna deveria funcionar mais ou menos assim: se um irmão comete uma falta, um pecado que venha a se tornar publico, deve-se fazer uma correção pessoal a ele; Se não der resultado, deve-se fazer o mesmo mas na presença de duas ou três testemunhas, ou a própria comunidade. Se ainda assim não houver emenda por parte do irmão e , o mesmo deve ser excluído da comunidade e "tratado como se fosse um pagão ou um pecador publico" (Mt 18, 17)

Naquele tempo, disse Jesus a seus discípulos: "Se teu irmão tiver pecado contra ti, vai e repreende-o entre ti e ele somente; se te ouvir, terás ganho teu irmão.
Se não te escutar, toma contigo uma ou duas pessoas, a fim de que toda a questão se resolva pela decisão de duas ou três testemunhas.
Se recusa ouvi-los, dize-o à Igreja. E se recusar ouvir também a Igreja, seja ele para ti como um pagão e um publicano.
Em verdade vos digo: tudo o que ligardes sobre a terra será ligado no céu, e tudo o que desligardes sobre a terra será também desligado no céu.
Digo-vos ainda isto: se dois de vós se unirem sobre a terra para pedir, seja o que for, consegui-lo-ão de meu Pai que está nos céus.
Porque onde dois ou três estão reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles".
(Mt 18, 15-20)

Primeiramente é interessante notar que o processo de excomunhão hoje vigente na Igreja ainda passa por todas as etapas referidas no Evangelho. A excomunhão é aplicada apenas quando há no pecado ou no ensinamento perigo para o resto da comunidade. Importante salientar ainda que ela não é em si uma punição, mas antes um chamado a reparação, visto que toda excomunhão contém em si uma cláusula onde, cumprindo certas exigências, o cristão é reintegrado ao seio da comunidade. Geralmente essas exigências são a reparação do mal causado, ou ensinado. Para fins didáticos eu cito por exemplo o dito Pe. Beto de Bauru, que tempos atrás foi assunto da mídia nacional por manifestar-se publicamente a favor do casamento homossexual e da comunhão a casais em estado irregular, como em segundas uniões ou uniões ilegítimas. Pois bem, o referido senhor foi avisado várias vezes da posição da Igreja e da imutável doutrina apostólica, e ainda assim não emendava suas atitudes. Por colocar em risco então a fé de centenas de fiéis, já que essas criaturas abençoadas sempre tem um carisma poderoso para fiéis menos informados, ele acabou sendo excomungado pela Santa Sé, após o absurdo de celebrar um "casamento" lésbico nas dependências da paróquia onde ele atuava.

Analisando esse caso percebemos que o conselho evangélico foi seguido plenamente, com os avisos prévios, os pedidos de emenda que chegavam a ele diariamente de todo o país. E como ignorou a todos, acabou sendo excomungado, isto é, declarado como oficialmente fora da comunhão cristã por ensinar doutrinas contrárias a verdadeira e única fé, e por representar perigo a salvação das almas dos fiéis que o seguem. Daí a divulgação pública de sua excomunhão. Não obstante, o mesmo pode retornar a Igreja se, nas mesmas instâncias públicas que denegriu a fé e a doutrina, pedir perdão pelas heresias e sacrilégios e fazer um propósito de emenda e reparação. 

Infelizmente as pessoas enxergam a excomunhão como uma punição aqueles que não seguem as regras ditas antiquadas da Igreja, quando na verdade se trata de um apelo publico a conversão. Como um conselho de mãe, que deseja que todos os seus filhos se salvem e cheguem ao conhecimento da verdade. Uma mãe portanto não deseja seus filhos longe dela, mas antes disso, os corrige de forma a guia-los no caminho que ela sabe ser o certo. Não é castigo, mas também não deve se condescendência com o pecado.

É por isso que o pecador só encontra perdão na descoberta da Misericórdia divina, que é também perfeitamente justa. Daí a Igreja insistir tanto no sacramento da Penitência, para os fiéis, e no do Batismo, para os pagãos, pois é através deles que a Igreja exprime a misericórdia e o perdão de Cristo. Infelizmente, no entanto, para muitos esses sacramentos se tornaram sinais vazios e por vezes infecundos. 

O Batismo é antes de tudo uma convenção social. Anos servindo o altar em dezenas de celebrações batismais eu percebi que poucos compreendem o real significado da eficácia salvífica desse sacramento. As pessoas se preparam para ele como alguém se prepara para uma festa, todos os preparativos se tornam importantes, como a escolha do local, dos convidados e das roupas, mas poucos realmente param para pensar no que é realizado naquele momento, onde todo pecado é apagado, onde se entra na Assembléia Crista, Povo Santo de Deus. Dos muitos batismos que presenciei só me recordo a expressão apática de mães e padrinhas super produzidas e de pais obrigados a estarem ali, para cumprirem um rito de passagem, do qual todos um dia tomaram parte mas que nunca se deram ao trabalho de questionar seu verdadeiro significado.

O Sacramento da Penitência é ainda mais esquecido, já que a sociedade atual desconhece o conceito de Pecado. Se tudo me é permitido não há motivos para pedir perdão, já que toda ação é válida desde que me faça feliz, felicidade essa julgada apenas pela consciência particular. Esquecem-se todos, desconhecem ou simplesmente ignoram, que a consciência cristã é apenas uma, guiada e moldada por Cristo e seguida pelos seus santos e santas. Essa sim deve ser a única consciência a ser seguida. 

Dito isto, gostaria de citar um episódio interessante, um textinho, que essa semana foi compartilhado por dezenas de católicos, bem desinformados diga-se de passagem, nas redes sociais. O mesmo teria sido compartilhado pelo Revmo. Pe. Fábio de Melo, que é bem conhecido por falar bobagens em rede nacional, quase todas sem nenhum respaldo teológico e baseados numa simplória psicologia do relativismo travestida de doutrina. Como eu não encontrei fonte confiável de que ele realmente tenha compartilhado isso, e como a página que postou o texto no Facebook é abertamente fake, fica nos créditos o nome do suposto autor, Gilberto Chagas Jr, que não sei quem é e pelo que pude ler nem quero descobrir.

"Então o jovem se ''converte'' e deixa de participar dos churrascos em família, deixa de frequentar a pizzaria nos finais de semana com os amigos do ''mundo'', não visita a tia doente porque está atarefado na igreja, não joga mais futebol com os amigos ''mundanos'', para de ir a praça da cidade para ''fugir da aparência do mal'' e deixa de apreciar artes em geral, porque são coisas do mundo e automaticamente do diabo. Tudo isso na ilusão de estar se santificando, quando na verdade não percebe que o isolamento não produz santos, e sim alienados!" (Gilberto Chagas Jr)

Quando li isso pela primeira vez eu ri, muito, depois parei, pensei um pouco e fui acometido por uma súbita ânsia de vandalismo, que mais tarde foi substituída por um pesar imenso. Me doeu imensamente ver a quantidade de pessoas aplaudindo tais disparates que são descaradamente contrários a doutrina moral da Igreja. Aposto minha batina que se Santo Afonso M. de Ligório lesse algo do tipo teria um infarto, ou um acesso de fúria, e depois um infarto.

O que o autor (sic!) chama de alienação a Igreja chama desde muito tempo de busca pela santidade, ou ele nunca ouviu falar que a santidade dobra primeiro os joelhos para depois dobrar o coração. É assim que se segue, sempre, primeiro o sinal externo, que se segue pelo interno, onde se dá a conversão de fato e que por sua vez novamente reflete no exterior. Por isso diz-se que a conversão é um ciclo permanente nessa vida.

O que o autor (sic!) chama de alienação é a fuga do mundo que tantos santos e santas encontraram ao longo de suas vidas. Ou será que Santo Antão do Deserto, Pai da vida cenobítica, deveria ser repreendido por largar sua vida completamente para viver no deserto, se alimentando de frutas podres enquanto meditava o Evangelho para só então conseguir converte-se realmente. Ou será que Santa Tereza, São Pe. Pio, Santa Terezinha e tantos outros, deveriam ser repreendidos por abandonarem os tios doentes, por não mais irem as praças e festas para encontrarem ambiente que pudesse levar a virtude? 

Se seguirmos com essa linha de pensamento deveríamos fechar hoje mesmo os milhares de conventos e mosteiros que firmemente resistem a letal onda de relativismo do mundo. Segundos os adeptos dessa crendice demoníaca o jovem cristão deve ser exatamente como qualquer outro jovem, quando o Evangelho pede, ou melhor, exige, que o cristão seja sal da terra e luz do mundo. Luz! Luz que se destaca, que brilha, que atrai a si a atenção para Cristo. 

Me doeu ver tantas pessoas compartilharem tais palavras, e aplaudirem de pé, que a vida de nossos maiores santos seja chamada de alienação. A vida austera, pobre, como é aquela proposta nos conventos, mosteiros, carmelos é via de santidade, e os exemplos daqueles que ali encontraram a Cristo e foram, e continuam sendo, exemplo para muitos cristão verdadeiros deve ser incentivada. Infelizmente o que se espera da juventude cristã é que ela respeite a todos tomando para si o seus comportamentos. 

Jesus disse que seus discípulos estavam no mundo, mas que não pertenciam ao mundo, mas sim a Deus, e hoje vemos os cristãos batendo palmas a incentivos de que nossos jovens devem, não só estarem no mundo, como serem do mundo e pertencerem a ele! Já que se não pode expressar a fé e a própria conversão com a mudança de comportamento, comportemo-nos então como pagãos. 

Que Nosso Senhor nos auxilie nessa jornada e que, reconhecendo nossas deficiências e pecados, possamos a cada dar um passo rumo a conversão da perfeita imitação de Cristo a exemplo de seus santos e santas, amém.

Oxalá ouvísseis hoje a sua voz:
"Não fecheis os vossos corações como em Meriba,
como em Massa, no deserto, aquele dia,
em que outrora vossos pais me provocaram,
apesar de terem visto as minhas obras". (Sl 94)

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