quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Deixem a cura para quem a quer

Dificilmente manifesto alguma opinião política, em qualquer meio de comunicação que seja, não por não tê-las, mas por estar mais preocupado com a roupa que vou usar pra ir ali na padaria do que em participar desse montante absurdo de opiniões desconexas que quase sempre se revelam superficiais demais para conseguirem compreender os problemas que apontam.

Mais uma vez a internet foi tomada por um verdadeiro tsunami de opiniões após a notícia de um juiz teria permitido que certo psicólogo usasse de técnicas de reorientação sexual, prática proibida pelo Conselho de Psicologia desde a década de 90. 

A Justiça Federal do Distrito Federal liberou psicólogos a tratarem gays e lésbicas como doentes, podendo fazer terapias de “reversão sexual”, sem sofrerem qualquer tipo de censura por parte dos conselhos de classe. A decisão, do juiz Waldemar Cláudio de Carvalho, é liminar e acata parcialmente o pedido de uma ação popular. Esse tipo de tratamento é proibido desde 1999 por uma resolução do Conselho Federal de Psicologia. O órgão disse que vai recorrer.

A ação popular foi assinada por um grupo de psicólogos defensores das terapias de reversão sexual. A decisão é de sexta-feira (15). Nela, Carvalho mantém a integralidade da resolução, mas determina que o conselho não proíba os profissionais de fazerem atendimento de reorientação sexual. Além disso, diz que os atendimentos têm caráter reservado. (Fonte: G1)

E foi isso que aconteceu. Mas claro, bastou apenas ler o título de algumas reportagens como a do Estadão que dizia "Juiz libera cura gay por psicólogos" para a internet ficar em alerta. Tags foram subidas, fotos de perfil trocadas por marcas d'água com a bandeira LGBT e centenas de textos e frases do tipo "O SUS não cura nem gripe, mas quer curar os gays?" Três dias depois de publicada ainda tem gente gritando aos quatro cantos do mundo que não precisa de cura... Pois bem, dito isso não poderia eu ficar de fora, mas no entanto venho com uma opinião bem diferente desta que a maioria das pessoas tem propagado.

Informação equivocada e leviana. Esses meios de comunicação tentam, inescrupulosamente, através de chamadas e texto que causam uma comoção social, aferirem mais visualizações para suas páginas, se aproveitando da credulidade do público geral.¹

Primeiramente um tratamento psicológico é antes de tudo pessoal, eu mesmo já fui forçado a fazer terapia (por outro motivo) e o resultado foi simplesmente nulo. Somente então quando eu mesmo decidi buscar ajuda é que ela se tornou efetiva. Pois bem, antes de tal liminar, se eu buscasse um profissional para me ajudar a reverter minha orientação sexual o mesmo não poderia fazê-lo, pois se veria impedido pelo Conselho de sua profissão. Então mesmo que precisasse o profissional não poderia me ajudar. Logo, a notícia é em si, muito boa para aqueles que não se sentem felizes assim.

A liminar não suspendeu a Resolução nº 001/1990 do Conselho Federal de Psicologia, e nem distanciou-se do posicionamento da Organização Mundial de Saúde. Muito pelo contrário, reforçou suas premissas no que diz respeito a não caracterização da homossexualidade como patologia, o respeito e promoção da liberdade, dignidade, igualdade e integridade do ser humano, o combate ao preconceito social em relação aos homossexuais.

Baseando-se na Constituição, no objetivo do bem-estar de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, bem como a liberdade de expressão da atividade intelectual, a referida liminar somente determinou que a resolução do CFP seja interpretada de modo a “não privar o psicólogo de estudar ou atender aqueles que VOLUNTARIAMENTE, venham em busca de orientação acerca de sua sexualidade”.¹

Curiosamente nenhum noticiário disponibilizou o texto oficial da decisão judicial que pode ser consultado aqui. E a grande mídia, aproveitando-se da dificuldade dos leitores para investigar a veracidade das informações, publicaram matérias chocantes que tem sido compartilhadas aos montes, criando desgosto, revolta e, claro, muita audiência. 

O que a Justiça fez foi apenas abrir a possibilidade de que aqueles que necessitem de ajuda possam ser ajudados, nada mais. É bom lembrar que mesmo estando em pleno século XXI os homossexuais nem sempre são vistos com bons olhos pela sociedade. E se uma pessoa sente-se infeliz vivendo com essas tendências. e querendo revertê-las, é melhor que seja ajudada. 

Obviamente não digo isso com o peso de uma palavra profissional, mas com o peso de alguém que sabe o que é ser gay. Se eu quisesse mudar, por não estar feliz sendo como sou, gostaria de ser ajudado e não empurrado mais ainda para o lugar de onde quero sair. Em outras palavras, se não estivesse feliz sendo gay, gostaria de ser ajudado. 

Claro, merecem especial atenção aqueles casos em que as pessoas são obrigadas a realizar esse tipo de tratamento, que acredito serão bem mais frequentes agora, mas excetuando os casos forçados não vejo nenhum problema em querer tratar de algo que faz mal e causa desconforto em algumas pessoas. 

Vejam bem, a liminar não dizia que ser gay era uma doença de novo, apenas dizia que as pessoas que, sendo infelizes com sua tendência homossexual, buscarem ajuda profissional possam ser ajudadas. Desse ângulo é uma excelente notícia, afinal vai de encontro com o que a Igreja Católica sempre ensinou:

"(..) Apoiando-se na Sagrada Escritura, que os apresenta como depravações graves, a Tradição sempre declarou que «os actos de homossexualidade são intrinsecamente desordenados». São contrários à lei natural, fecham o acto sexual ao dom da vida, não procedem duma verdadeira complementaridade afectiva sexual, não podem, em caso algum, ser aprovados." (CIC 2357). 

De acordo com a decisão do juiz federal Waldemar Cláudio de Carvalho, sua determinação tem como objetivo não privar o psicólogo de estudar ou atender a pessoas que "voluntariamente venham em busca de orientação acerca de sua sexualidade". A decisão basicamente diz que quem quiser procurar tratamento tem direito a ter a ajuda disponível, além do fato de que se o psicólogo quiser oferecer o tratamento ele não pode ser menosprezado por isso. QUEM QUISER PROCURAR.

Não me considero doente por ser gay, e em nenhum momento da liminar foi dito que era uma doença, mas apenas penso que, se não tivesse nascido num lar cristão e acolhedor, provavelmente iria sim, querer e precisar de ajuda, e ficaria feliz em tê-la.

Não entendo como um movimento que quer tanto respeito e liberdade não entende a decisão e não respeita a pessoa que não quer viver tais práticas. Se a pessoa não quer, ela tem todo direito. Pessoas que possuem tendências homossexuais necessitam encontrar meios para carregar essa cruz -- o que em muitos casos é algo extremamente doloroso -- a qual pode ser encontrada por meio da vida de oração, direção espiritual, participação de grupos, troca de experiências etc. Entretanto, muitos ainda necessitem de acompanhamentos psicológico para poder ter um melhor autodomínio, aceitação e viver de forma cristã a virtude da castidade! Além disso, pode acontecer que aqueles que possuem isso muito forte -- pode, não disse que irá -- superem essas tendências e consigam ter relacionamentos heterossexuais com ajuda profissional, por que não? 

"As pessoas homossexuais são chamadas à castidade. Pelas virtudes do autodomínio, educadoras da liberdade interior, e, às vezes, pelo apoio duma amizade desinteressada, pela oração e pela graça sacramental, podem e devem aproximar-se, gradual e resolutamente, da perfeição cristã." (CIC 2359). 

Lembrando que a mesma Igreja nunca nos menosprezou ou nos excluiu, mas apenas nos chamou à castidade, como a todos os outros batizados, sejam os que vivem no celibato sacerdotal ou a castidade conjugal de um matrimônio. Nunca me senti descriminado na Igreja, nunca me sento ofendido sendo homossexual, muito pelo contrário, sei que se não fosse a minha caminhada nela que estaria muito provavelmente fazendo aquele papel ridículo dos reacionários gays que zombam da Fé e da Igreja na justificativa de defender seu espaço na comunidade.

Por anos os parágrafos do Catecismo que citei foram as palavras que me fizeram perseverar, e ainda hoje busco, de alguma forma, me aproximar da perfeição cristã de que ele fala. Agradeço a Deus pelo chamado à castidade, que muitas vezes bem sei que ignoro, mas que se não fosse por ele, estaria perdido num dos muitos antros de pecado que o mundo oferece, na ilusão de estar buscando alegria e satisfação, quando na verdade oferecem apenas a própria condenação. Minha fraqueza pessoal é uma questão completamente diferente, e não encontra eco na tradição e nem justifica seu uso aqui.

Então, é bom que os que estão fazendo todo alarde na internet, revoltados, entendam o que de fato a justiça determinou e deixem quem quer ter uma ajuda por meio de um acompanhamento psicológico, para os auxiliar, em Paz, e vá viver a sua vida!

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1. Linkedin. A mentira da cura gay e a necessidade da cura midiática

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