terça-feira, 1 de setembro de 2020

Aceitar

O jeito é conformar-se, aceitar de modo resiliente as vicissitudes, as tormentas mais brutais que sopram por sobre as águas de nossos mares. O jeito é não reclamar ou, se for reclamar, que o faça sabendo que isso nada vai mudar em nada. O que for pra ser será, e mesmo que isso não diga nada ainda é uma verdade. Não há como lutar contra um terremoto que a tudo agita  debaixo de nossos pés, lançando longe o que bem lhe aprouver. 

O jeito é conformar-se com as noites escuras, tornar a casa sossegada e fazer dela o jardim fechado de nossa alma. Transmutar a solidão, fria e vazia, na solitude calma e aconchegante e, numa noite de clima ameno, observar sozinho as estrelas num lugar distante, ouvindo um delicado blues ao fundo. É, é uma visão que me agrada. Mas é uma visão que eu mesmo construí, apenas para rebater aquela que se contrapõe a ela, aquela visão cor de rosa, que brota de dentro de mim sem que eu tenha qualquer controle, e que me faz sonhar coisas inalcançáveis. É um esforço para colocar os pés no chão e aceitar, conformar-me, de modo resiliente tudo o que não posso vencer, e que se apresenta a mim como uma estrutura da própria realidade. É só o que posso fazer, só me resta aceitar. 

Aceitar que querer mudar o mundo é um sonho bobo de criança. Aceitar que sonhos com grandes e luxuosas casas, ou com amores invencíveis, são apenas sonhos bobos de jovens iludidos pelas paixões. Aceitar que o mundo não é cor de rosa, antes disso, uma realidade pintada em cinquenta tons de cinza diferentes. 

Aceitar que alguns ganham, alguns perdem, e outros só cantam blues. O amor não é para todo, o sucesso não é para todo, o conhecimento e a sabedoria não são para todos, o poder não é para todos. Vivemos entre a constante tensão do que foi determinado e do que escolhemos ser e fazer. Isso não tem solução, as coisas são assim e pronto. Então só nos resta, só ME resta, aceitar. 

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