segunda-feira, 20 de junho de 2022

Perfume das Flores

Existem vozes capazes de acalmar a ira das almas, de fazer cessar as tempestades e silenciar os corações mais ávidos em declamar as suas dores. Há vozes que silenciam o espírito e devolvem a paz que foi roubada, há vozes que nos fazem sentir a tranquilidade ser de novo injetada em nosso sangue e novamente percorrer nosso corpo, devolvendo o homem aquele estado de pureza que tinha naquele útero primitivo que perdemos há muito tempo atrás. Algumas vozes me fazer sonhar, sua doçura é como o perfume das flores do campo, inebriam os sentidos e me fazem esquecer que a minha experiência, a minha existência, é defeituosa. 

Mas do que estou falando? Novamente pareço incorrer no erro de me deter em explicações tão poéticas (ainda que limitada pela minha pobreza estilística) que pareço não estar falando de nada em particular, mas a verdade é diversa dessa impressão inicial. 

Muitas vezes eu olho para mim mesmo, minhas numerosas limitações, meus pecados, meus muitos defeitos, e isso me faz querer culpar o mundo, o demiurgo que me aprisionou a gemer e chorar nesse vale de lágrimas, mas, se ouço aquela voz que consegue tocar meu coração eu então sou levado a encarar a realidade de que, de fato, trata-se dos meus defeitos e das minhas limitações, e não de um mundo malvado que trama contra mim, mesmo que muitas vezes seja o que parece. 

Quantas vezes eu não culpei o destino pela minha melancolia? Quantas vezes eu não conseguia enxergar sentido na minha existência e culpei ao próprio Deus por não me revelar esse sentido, quando eu já havia desistido de procurar por ele?

Mais uma vez o erro estava em mim, assim como as respostas que eu procuro estão, de certo modo, em mim, mas não em mim propriamente dito, mas Naquele que em mim é mais Eu do que eu mesmo. 

A doçura da voz é capaz de me trazer de volta, é a realidade que fala, e se estou disposto a ouvir ela me oferece algumas respostas. O desejo de saber tudo, no entanto, é fruto da arrogância e do desejo delirante de onipotência, a realidade, Deus, nos dá aquilo que precisamos e podemos saber, reservando tudo o mais para que Ele mesmo nos explique quando melhor convir. 

E isso foi apenas um pensamento que me passou de relance, enquanto ouvia uma aula de filosofia política e sentia o peso da carência a despertar em meus braços anseios luxuriosos de quem não sabe o que quer e que se confunde ao achar que o abraço de um homem pode sanar as minhas dúvidas. Uma voz doce e delicada então me levou a refletir nisso que penso ser uma verdade, gentilmente revelada a um indigno aprendiz que, agora, apenas deseja ter a tenacidade de conseguir, mesmo coberto de sangue e lama, trazer aos lábios uma bela rosa.

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