quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

Descendo ao último círculo de Dante

Lúcifer, Gustave Doré

"Em leito de penas 
não se alcança a fama nem sobre as cobertas; 
Quem a vida consome sem a fama,  
não deixa de si nenhum vestígio sobre a terra, 
qual fumo no ar e espuma na água."
(Dante Alighieri)

Eu devia parar de reclamar, sei bem disso, mas você perguntou como eu estou e quando disse que estou bem, na verdade queria dizer que estou absurda, brutal e absolutamente cansado. Cansado e chateado de tanto trabalho, de que todo problema acabe vindo parar nas minhas mãos quando, em verdade, em mal tenho me aguentado de pé. Por isso as pessoas até vêm estranhando meu mau humor, mas isso é tudo que elas conseguem ver. Acontece que eu tenho estado num esgotamento depressivo tal que, as únicas forças que me restam são para que desempenhe as minhas funções minimamente, não sobrando muito espaço para mais nada. Então apenas volto pra casa, assisto e durmo, sem pensar demais em mais nada.

E, além disso, tenho saudades de você, do seu abraço, do seu cheiro, do seu carinho. Porque aqui dentro, num cantinho do meu peito, eu acredito que se sentisse sua mão nas minhas costas uma vez mais, e se pudesse me encostar em você um pouquinho que fosse, ficaria bem, tudo ficaria bem.

Me vejo de novo perdido em meio aos meus desejos. A mente sente a depressão ao mesmo tempo que o corpo sente a euforia. Me sinto escravo de meus desejos, quase a subir pelas paredes, gemendo e chorando, como um animal que não pensa em mais nada além da sua própria luxúria. é horrível isso, é horrível ser assim, escravo, preso a um corpo que deseja se destruir, se consumir em fogo até virar cinzas, até voltar ao nada...

Deveria voltar pra casa e estudar um pouco? Dificilmente vou me concentrar assim. Devia ir a missa? Estou indisposto pra ver abusos litúrgicos... Mas quero vê-lo, pelo menos um pouco... Mesmo longe dos meus braços se ele ao menos estiver ao alcance das minhas lentes... É, talvez eu deva ir lá um pouco.

X

Não consegui. Cheguei em casa com muito custo, quase não ouvi nada da aula sobre o Peri Hemeneias, e só consegui ter alguma atenção ao ver dois episódios de série, a segunda inclusive acabou agravando meu problema. O primeiro episódio da tão aguardada Playboyy deixou todo mundo de ânimos exaltados, já que quase metade do episódio foi com cenas de sexo. Mas todos aqueles homens lindos se chupando por mais de uma hora não me fez bem. Isso me deixou ainda mais carente, sendo que na verdade trata-se de um episódio de hipersexualidade, por isso fiquei tão à flor da pele assim e preferi até mesmo me afastar das mensagens para não fazer alguma besteira, como da última vez que fui parar num barraco escuro e úmido que facilmente se veria nas páginas policiais. 

Essa noite foi então um grande borrão, apenas me recordo do corpo arder em chamas. Tentei me acalmar com música e com os óleos essenciais, e talvez tenha funcionado porque entrei num estado quase letárgico, em partes ainda mais solitário e chateado porque nenhum deles me procurou e porque, uma vez mais, olhei pela janela e, aquela paisagem vazia do mangue, era um reflexo do que eu mesmo sentia: escuro, assustador, perigoso e, acima de tudo, solitário. Bebi um pouco mais daquele coquetel que achei no mercado perto de casa, a terceira garrafa essa semana, e fui dormir, depois de uma punheta, torcendo pra acordar um pouco mais humano.

É assim, nem é só uma vontade de masturbação, eu estou bem resolvido com isso, mas é um vazio brutal que parece que vai sugando tudo, eu viro um monstro, os pensamentos que passam na minha cabeça são os piores possíveis. É como um buraco que vai crescendo, crescendo e parece que vai me engolir inteiro. No lugar vai tomando forma um demônio, que por sua vez também começa a devorar, mas, ao invés do vazio, devora o mundo ao redor, espalhando dor, horror e porra por onde quer que passe. 

Eu passo então a desejar dar para todos os homens. Foder como uma cadela no cio. Me banhar no suor de todos aqueles machos que pululam nos vídeos mais nojentos da internet, fruto do que há de mais podre na mente humana e, naquela hora, acho tudo isso muito bom e meu corpo deseja toda essa profanação com cada fibra do meu ser. É como se não restasse nada de humano e eu fosse apenas a manifestação dos desejos mais primitivos e bestiais que há. 

É repulsivo. Eu sou um lixo. 

Hoje tem formação, eu devia ir e talvez vê-lo, mas não sei se tenho disposição para isso, para ouvir besteiras sobre algo que gosto tanto e que tratam com tanta displicência, mas eu queria vê-lo, ou ver alguém bonito pra variar, mesmo que nenhum deles olhe para mim ou dê pela minha existência.

E continuo sozinho, e em chamas a me consumir. 

Breve serei cinza fria. E depois, nada. 

E tudo retorna ao nada.

"Tenho que encontrar alguma coisa que me tire a vontade de beber. Veja só hoje, por exemplo. Não há nada pra fazer a não ser tomar porre. Não gosto de cinema. E jardim zoológico é um pé no saco. Não se pode passar o dia inteiro fodendo. Que problema..." (Charles Bukowski)

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