quarta-feira, 27 de março de 2024

Algumas coisas felizes

Ganhei um terço, daqueles feitos à mão, e a moça que me entregou disse que ele foi feito por aquele rapaz. Meu coração deu um salto na hora e eu sorri, terno, mesmo sabendo que provavelmente foi algum tipo de sorteio e que ele não deve pensar em mim o suficiente para fazer algo assim. De todo modo ele tem meu nome, e passou alguns minutos, que seja, pensando em mim, o que já me deixa bem mais feliz do que estive nos últimos dias. Kaoru, pelas mãos do acólito de meus sonhos a tocar o vaso sagrado do meu coração.

Gostaria de estar dormindo, se tornou um hábito, certo vício em me alienar e me distanciar de todas as coisas. É simples, eu só não quero ver, não quero ter que me preocupar, não quer estar sóbrio ou consciente. 

Até tentei, algumas vezes, falar sobre o que me incomodava, sobre o que me machucava, mas tenho estado tão cheio de coisas, tão atolado completamente em obrigações, formações, dúvidas, escalas, ensaios, grupos, que tenho achado melhor tirar proveito da apatia que sa abateu sobre mim num episódio misto brutal, em que tenho experimentado uma depressão que me faz pensar na morte a cada cinco minutos ao mesmo tempo que meu corpo reage aos estímulos da pressão social. Consigo ir a todos os compromissos, mas a minha alma continua adormecida na cama, sonolenta, e minha vontade é de simplesmente voltar ao nada. 

Odeio tudo isso, odeio como me tratam como idiota, e sei que deveria dizer algo, mas me falta força para encarar esse embate, me falta vigor, tudo que quero é paz, mas mesm ficar assim não tem me deixado em paz, aliás, nem sei se isso existe. Mas tenho enfrentado isso, e meu corpo já vem dando sinais de não suportar, até porque abusei dos remédios pra dormir no último fim de semana e já comprei mais para o próximo. Não tenho dado nenhuma importância pra saúde, não quero me autopreservar, ao menos não no sentido de prolongar minhar vida, apenas não quero ser incomodado. Só isso já me basta. Já não sonho com o amor, com a fama ou o sucesso, tampouco com a santidade. Só quero poder voltar pra casa e dormir, em paz. 

Foi inesperado quando, no meio de tudo isso, uma amiga me pediu que enumerasse as últimas coisas boas que tinham me acontecido, e percebi que, embora simples, essas coisas realmente me deixaram um pouco melhor. De fato me abriram a perceber esses pequeninos detalhes que, no meio de todo oceano que me tem acontecido, tornam alguns momentos um pouco mais leves. 

Fiquei feliz pela chegada do outono, com alguns dias um pouco mais frescos. Poder chegar até a parada de ônibus sem estar suado é um diferencial e tanto, talvez devesse considerar morar numa cidade onde é sempre mais frio. Encontrei uma nova playlist com músicas leves, mas não tristes, e a ouvi inteira três vezes nos últimos dois dias. Embalado pelo ritmo simples, delicado, das vozes e dos poucos instrumentos eu respiro um pouco mais fundo, me recordando que esse dia vai acabar e essa semana também. O café que fiz ficou uma delícia, e desde que comecei a tomar café me esqueci de como é parar para apreciar uma caneca assim, fumegante e perfumada, sentindo o sabor e o aroma ao meu redor. E fiquei feliz ainda pelo terço que ganhei, e me recordo de ter dormido segurando-o, em algum dia daqueles de depressão mais profunda, seja numa centelha de esperança de uma ajuda divina ou pelo conforto da memória de saber que, por alguns minutos, ele pensou em mim ao separar cada uma daquelas pequenas contas de rezar. 

Nem tudo precisa ter um significado profundo, discutido exaustivamente pelos maiores filósofos e pensadores. Na verdade, no meu atual estado, sentir o perfume do café enquanto escuto uma boa música, mesmo em meio ao caos, tem sido tudo que eu posso tirar da vida. E o mais qu faço não vale nada!

E claro, mais uma coisa me fez feliz: ver uma foto dele, sorrindo, simplesmente tentando me fazer feliz num dia como esse. Isso fez toda a diferença.

"Meu amor, essa é a última oração, pra salvar seu coração..."

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