sexta-feira, 1 de março de 2024

Prudência e Silêncio

"O amor é um sentimento autônomo, que a prudência pode ajudar a evitar, mas não saberia vencer." Choderlos de Laclos

Quero só ver, que é uma forma de dizer que eu preferia morrer a ter de ver realmente, quando todo esse cansaço resolver se manifestar. Noites sem dormir direito, energético, café, mudança nos móveis do trabalho... Já sinto algumas partes do corpo doerem mais do que deveriam, e me preocupo com o surto de dengue que assusta as autoridades, principalmente ao ver meus braços cheios de picadas. Mas então eu continuo chegando em casa tarde da noite, faço um macarrão instantâneo e vou dormir depois de várias horas ainda acordado. Vindo hoje cedo pro trabalho eu passei num mercado e comprei duas latas de energético, o que mostra que, no auge do meu Transtorno Bipolar, estou prestes a um colapso físico, mas ainda tenho missa esse fim de semana e, na terça, um evento que vai até mais tarde. 

Mas o que me impressiona nem é o quanto essa fase eufórica tem perdurado, não, mas é que, no meio de tudo isso, eu ainda consigo pensar nele, e ainda consigo, mesmo depois de outra forte resolução, ou talvez não tão forte assim, prometer a mim mesmo que não iria mais tratá-lo como namorado. Ato falho, não que seja preciso dizer de novo. Menos de uma semana depois de uma, outra, conversa decisiva em que me abriu aos olhos esclarecendo minhas confusões, eu estava enviando a ele fotos de casais dormindo abraçados, sem a necessidade de dizer que, mesmo com todo o turbilhão na minha cabeça, a imagem de nós dois juntos tem, em mim, esse efeito meio hipnótico mas, ao mesmo tempo, também terapêutico e, last not least, essa aparência de sonho acordado dirigido: um lugar calmo. Paz.

Pelo menos consigo brevemente voltar a sanidade do ceticismo romântico ao ver que, no meio de todo esse caos também, ele se importa mais com outras questões do que esses sentimentos bobos que me afetam tão profundamente. É interessante o quanto minha mente é turva diante desse assunto sendo que, essa imagem significa justamente uma clareza no turbilhão das ideias, ao mesmo tempo que é justamente um completo aviltamento do intelecto em detrimento do meu subjetivismo sentimental.

Um homem apaixonado é o pior inimigo de si mesmo. Talvez a melhor coisa que se possa aprender a se fazer quando se ama tão descontroladamente é ficar quieto e em silêncio. 

"Eu te peço perdão por te amar de repente
Embora o meu amor seja uma velha canção nos teus ouvidos
Das horas que passei à sombra dos teus gestos
Bebendo em tua boca o perfume dos sorrisos
Das noites que vivi acalentando pela graça indizível dos teus passos eternamente fugindo
Trago a doçura dos que aceitam melancolicamente.
E posso te dizer que o grande afeto que te deixo
Não traz o exaspero das lágrimas nem a fascinação das promessas
Nem as misteriosas palavras dos véus da alma...
É um sossego, uma unção, um transbordamento de carícias
E só te pede que te repouses quieta, muito quieta
E deixes que as mãos cálidas da noite encontrem sem fatalidade
O olhar estático da aurora."
(Vinícius de Moraes)

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