"Mas seu amor se estendia muito além das regiões do desejo físico." (Marcel Proust)
Dormi profundamente, e não tenho nada de mais interessante a dizer além de como é bom dormir e acordar naturalmente. Levantei, fiz um pãozinho na chapa, chocolate branco quente, aproveitando um dia fresco de primavera. Sentei para ouvir um pouco de música, meus pais foram à missa e o resto do pessoal continua dormindo. Disse no meu último texto que essa talvez tenha sido a primeira noite que consegui aproveitar, depois de muitos meses. Me sinto feliz. Embora nublado, o céu está de um cinza-claro, mais embaçado do que realmente fechado. Simplesmente lindo. Não demorou muito para o meu pensamento se voltar para ele. Droga, eu realmente o amo. Tomei o resto do chocolate num gole só. Vinte gotas de Rivotril e um relaxante muscular, o suficiente para dormir mais um pouco e ainda acordar para cantar na missa da noite. Ainda não estou seguro com aquele solo. Também queria conseguir ficar pelo menos uma manhã sem pensar nele. Bem, vou voltar a dormir.
Antes, porém, de cerrar os olhos e mergulhar no véu negro do sono profundo, escrevo a um amigo: são palavras sinceras que, no entanto, não serão enviadas.
Depois de certo tempo e de umas boas doses de desilusão, aprende-se que algumas coisas, a maioria delas, na verdade, não deve ser dita. As incompreensões são geralmente acompanhadas de afastamento total ou parcial. O Dilema do Ouriço de Schopenhauer em sua máxima aplicação. No momento tenho preferido a distância e o frio. As coisas que eu quero dizer, escrevo. Sempre que digo, que me abro, acabo por gerar confusões incômodas demais.
Me fechei na última semana, e pretendo evoluir essa ação. Colocar as coisas, ao menos externamente, no seu devido lugar. Enquanto pouco a pouco faço um exercício profundo de transmutação do meu ser. Parece-me que são percepções maduras. Não permitir que o coração domine tudo e, ainda que domine o sentimento, não permitir que ele domine a ação, chegando sempre até a humilhação.
Pois bem, hoje é um daqueles dias que eu gostaria de uma companhia que, na intimidade suprema do silêncio, me permitisse descansar, corpo e coração. Ao mesmo tempo. Que me permitisse chorar, colocar pra fora tudo que tem me angustiado nos últimos meses, e que me aquecesse, com seu corpo e seus braços ao meu redor, a respiração entrando em harmonia. Algo assim. E poderia ser um amigo, alguém próximo, mas alguém presente, real. Onde é que há gente de verdade no mundo? Onde posso encontrar um abraço real?
Mesmo que tenha feito avanços recentes e novos amigos para conversar, a verdade é que vou me deitar sozinho, sem ninguém a me consolar ou abraçar. Pelo menos tomei um bom chocolate quente antes de me deitar. Foi algo bom em meio a esse confronto com minha realidade.
Claro que, mesmo indo dormir, já chapado, não demorou muito para o meu pensamento se voltar para ele. Droga, eu realmente o amo. Aproveitei uma noite de verdade, mas hoje não consegui sair da cama. E por isso preciso ficar em silêncio e dormir. Até que consiga empreender a transmutação alquímica dos meus sentimentos...
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