quarta-feira, 28 de novembro de 2018

Resenha - A Brief Inquiry Into Online Relationships

O texto a seguir é a resenha, ou quase isso, de um álbum. Não é bem uma resenha porque eu coloquei aqui mais do que a minha opinião, mas fiz uma incursão, uma imersão no universo que a música me propôs. Talvez seja mais correto dizer que o que eu escrevi foi o registro da experiência de apreciação de uma obra, sim, isso me agrada mais. Como o texto foi copiado de uma conversa de WhatsApp pode parecer que as vezes estou falando com alguém, mas é porque de fato estava, isso é só pra justificar uma possível aura esquizofrênica aqui e ali. Enfim, é isso:

Sobre a obra trata-se do álbum A Brief Inquiry Into Online Relationships da banda inglesa The 1975. 

Quanto a intro e a primeira faixa eu gostei muito. Realmente a guitarra deu um certo desconforto. Mas eu teria achado isso se você não tivesse comentado? Nunca saberemos. De qualquer forma gostei da sensação nostálgica que senti com a melodia, aliás, senti que essa será a proposta aqui. Foi uma viagem a uma noite escura, mas brilhante pelas luzes dos postes na estrada e barulhenta pelo som do carro que corria estado a fora. Sabe quando estamos com alguém que nos faz perder a noção do tempo e do espaço? Isso.

Se a primeira foi uma viagem na estrada a segunda quase foi uma viagem lisérgica. Mas não chegou a tanto. Diria que é uma viagem na cerveja, quando o álcool entorpece as extremidades, e o riso vem espontaneamente sozinho. Gosto disso, gosto como uma companhia pode nos fazer sentir bêbados assim, e posso dizer que também gosto de lembrar que já me senti assim, o que acho que foi a impressão principal aqui.

How to Draw/Pretrichor - Também ficou no quase lisérgico, e eu estou encarando isso como um cenário. Agora estamos parados numa caminhonete, em algum lugar, deitados. As estrelas nos levam ainda mais longe, o que é isso que vagamente se delimita no horizonte? Imagens do passado, sonhos do futuro, se mesclam misturando suas cores. Lágrimas escorrem, a batida disfarça os gritos que vem da verdade pintada no coração. As mentiras não podem se repetir.

Eu comecei a ler agora o que você mandou, e a primeira linha de Love It If We Made It confirma que acertei em minha interpretação.

A verdade que se revelou a nós na música anterior agora se deixou marcar profundamente em nosso corpo. A agulha da heroína é uma boa imagem pra mostrar a verdade que entra e que transforma. E qual a verdade? Olhamos ao redor e vermos que estamos próximos uns dos outros, mas isso só serve pra mostrar o quanto somos ruins, de que adianta contemplar de perto um quadro que só nos causa arrepios? Assim é se aproximar do outro. Seria um sonho conseguir ver algo de bom não seria? Eu adoraria se conseguíssemos.

By My Mistake mostra a solidão. Alguém se sentou na traseira na camionete, pegou o violão e olhando pra fogueira pensou nos erros que cometeu, das lembranças boas que teve ao lado de alguém. Ele lamenta pelo futuro que foi apagado pelos seus erros, e se entristece até pelas piadas que não mais vai ouvir. 

A ironia está na primeira frase e em toda a aura da faixa seguinte, Sincerity Is Scary. Gostei da forma como o instrumental nos deu a sensação de uma cara compreensão. É uma pessoa que com humor ri das próprias desgraças. Mostra um grau elevado de dor, o homem que já não vê saída senão no desespero que é usar a própria desesperança como força de seus objetivos. 

I Like America & America Like Me - Voltamos a viagem lisérgica, já beirando a sobriedade quem sabe, ou a completa loucura. É difícil de precisar se estamos drogados, loucos, desesperados ou se isso já é a antessala da morte, cujo contemplar nos transcende a capacidade descritiva por meio de meras palavras.

Já não sabemos mais quem somos, o que somos. Isso é fogo? Eu sou só um mentiroso? As vezes os conceitos são imprecisos demais pra mostrar qualquer coisa além da completa falta de compreensão do mundo que nos cerca. 

Agora percebemos que até aqui a viagem que fizemos foi um caminhar para a morte. Já estava prenunciado? Estávamos num sonho, mas não um sonho qualquer, um sonho do passado que se mesclou num sonho do futuro no prólogo da morte. Inception. Sozinho em seu quarto, abandonado pelos seus amigos imaginários (online) ele morreu, na parte mais afastada do mundo.

De que adiantou tudo isso? De que adianta ter a mente aberta ao mundo, se ninguém pode compreendê-la? De que adiantou você ter compartilhado com o mundo todo se isso ainda não nos faz entender o que se passa dentro da sua mente? 

Ponto pacífico que até aqui compartilhamos as impressões sobre um mundo, com um mundo que não pode nos entender. A percepção dessa verdade se culminou nessa faixa It's Not Living (If It's Not With You). Ele disse com todas as letras o que antes estava dado subjetivamente ma non troppo. Me fez questionar todo o tempo que fiquei aqui, de frente pra uma tela com a figura do mar, enquanto as ondas se quebravam as minhas costas.

Nem todos morreram, alguns ainda lutam, mesmo que isso signifique que outros ainda cairão e que teremos de assistir. Alguns ainda tem de ficar de pé. Quantas pessoas travam suas batalhas diárias, à beira da desistência ou da morte, à beira da derrota. Muito embora seja um tipo de canção de reabilitação, Surrounded by Heads and Bodies mostra o campo de batalha do ponto de vista da fraqueza.

Que bela imagem Mine nos mostra. Um bar, na madrugada vazia, onde o som nos remete a realidades distantes, quase etéreas. As notificações chegam, o passado volta no acender de luzes de um celular. A beira da praia o ar salgado entra pela porta e se mistura com o gosto amargo da bebida abandonada. O sax nos faz derramar uma lágrima, a lembrança nos faz desejar jogar longe o celular, ou chorar amarga e silenciosamente enquanto na superfície a expressão séria contempla a escuridão de um ponto qualquer da parede.

Somos levados logo a próxima parada com I Couldn't Be More in Love. Alguém subiu no palco, e com extrema destreza disse em voz alta tudo o que estávamos escondendo no íntimo. A bebida acabou, a alegria também. O gosto amargo se mescla ao sangue. As notificações acabaram. Só nos resta fechar os olhos e assentir com o que ouvimos. Mas e então, o que fazer com esses sentimentos que há em nós?

E chega a hora de ir embora. Já vimos o quanto alguém destruiu a si mesmo iludindo-se com a sensação de aproximação que não aproxima realmente. Já vimos alguém lutar apenas com a força de um espírito partido. E nos perguntamos se queremos seguir o mesmo caminho, ou se não, que caminho queremos? As vezes só queremos morrer. É o que a constatação desse mundo frio nos faz desejar. O dia amanhe, e o sol quente aos poucos inunda o bar em que dormimos. Na rua, sentimos o calor, mas nada que possa voltar a aquecer a alma. E então há uma batalha, a última, entre a escuridão que brota no íntimo e a esperança que nos é impelida pelo sol. Qual haverá de ganhar?

The end, I guess.

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