sexta-feira, 1 de janeiro de 2021

Asuras

O sujeito se encontra perdido, em meio aos risos e as felicitações de Ano Novo. Poucas coisas me irritam tanto quanto a felicidade geral, sinal absoluto da ignorância generalizada e da cegueira universal: a alegria dos pobres é a máxima demonstração da miséria humana! 

Vindo de carro com um conhecido nós passamos por algumas pessoas que passaram a noite inteira bebendo, todas felizes, realizadas. Inclusive um sujeito que dirigia sem rumo algum no meio da rua, batendo o carro nas lixeiras enquanto seu banco estava deitado como se fosse dormir, e é bem provável que o fosse mesmo. Meu companheiro disse "é isso que faz o brasileiro feliz."

E é bem verdade. O brasileiro miserável que só pode ser considerado homem numa larga analogia, pois de homem só possui a aparência física e o nome, tendo perdido sua humanidade em algum lugar dos corredores das universidades ou nas páginas dos jornais recheados de propaganda esquerdista e socioconstrutivismo, ou pelo desconstrucionismo ou, ainda, pelo relativismo que colocou qualquer coisa no mesmo nível dos grandes nomes da humanidade, pensando estar assim elevando o homem, quando na verdade o diminuía a um nível abaixo do humanamente aceitável. Não me ofendo quando dizem que o homem é um descendente do macaco, ao ver as pessoas ao meu redor chego a crer que os macacos é quem deveriam se ofender. 

Enquanto isso a Missa da manhã estava quase vazia. O compromisso das pessoas com o serviço da igreja nem de longe é prioridade como as festas de fim de ano. A ressaca é mais importante. Tudo bem, afinal ninguém é obrigado a ir pra igreja, mas com certeza isso quer dizer alguma coisa sobre o espírito humano, e aqui eu uso a palavra espírito ainda bem distante do sentido religioso, sobre esse eu prefiro nem comentar, mas no sentido de espírito baixo mesmo, de pessoas que já perderam há muito toda e qualquer senso de prioridade. Quando beber e ouvir música ruim se torna mais importante do que qualquer outra coisa pode-se dizer que o homem atingiu o seu estágio mais baixo, pelo menos até aqui. 

E talvez o homem só quisesse preencher o seu vazio. A música e a bebida o distraem desse medo que é o de constatar estar sozinho no mundo, o medo o faz buscar refúgio onde há menos esforço. É mais fácil beber e ouvir música ruim. Não quer beber seja de todo ruim, eu o faço sempre aliás, mas quando isso se torna a única fonte de alegria do homem algo de muito errado está acontecendo. Quanto a música ruim não há exceção, ela é sempre sinal de decaimento, emburrecimento, embotamento da inteligência e do espírito e toda sorte de diminuição do homem ao nível dos animais, daquelas bestas dos contos antigos, aquelas mesma que no mundo Asura vivem de guerras e dos prazeres mais baixos da carne, rindo-se dos Devas, os deuses, como se fossem superiores a eles, sem perceberem que estão a chafurdar na lama imunda. 

Eles se perdem em meio a um turbilhão de solidão, traição, ganância, luxúria. Um mundo onde os pecados são os reis que governam seus súditos com mãos de ferro.

Não culpo de todo os que se entregam a esses prazeres, eu mesmo também possuo os meus vícios mas, alguém disse isso, não é como se eu também não fosse um fantoche nas mãos do demônio, a diferença é que eu consigo ver algumas das cordas que ele usa para me levar de um lado para outro. 

Também eu me jogo nesse mesmo mundo de guerras e prazeres, me deixando levar pela ira contra aqueles que possuem vícios diferentes dos meus. 

Mas a ira também vem ao observar esse mesmo mundo, mesmo sem levar em conta a influência dos homens sobre ele. E ele continua hostil, inviável, lutando a todo momento contra nossa sobrevivência, buscando erradicar a nossa existência mas sem dar cabo do nosso ser. Concluo daí então que esse mundo não é mais do que uma tremenda sacanagem: é feito apenas para nos ver tentar, mesmo sabendo que tudo vai dar errado sempre. É opressivo e esmagador e é uma constatação dura e fria como ferro, olhar ao redor e ver que tudo conspira contra o homem, inclusive o próprio homem, seja em si mesmo ou no próximo, todos lutando como monstros, demónios asuras. 

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