quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

De relações

"Eu sou eu! Eu me tornei eu mesma com o auxílio dos laços e relacionamentos que existem entre mim e os outros. Sou formada pela interação com os outros. Eles me criaram como eu os criei. Esses relacionamentos e interações servem para moldar os padrões do meu coração e minha mente. 

Isso são laços? 

- Isso, esse é o nome para aquilo que compartilho com aqueles que criaram a coisa conhecida como Rei. Isso é o que continua me moldando."
(Neon Genesis Evangelion)

É fim de manhã, o sol começa a dar sinais de que vai diminuir um pouco a sua ira causticante e a tarde será um tanto mais fresca, ou talvez seja só uma impressão minha, tirada do fato de que estou quieto no meu quarto, janelas bem abertas, sentado abraçando as pernas ouvindo alguma banda de j-rock, com suas melodias doces e vozes coloridas. 

No meu celular um amigo reclama da falta de profundidade nas conversas com outros, parece que todos só sabem falar de sexo e nada mais, conquanto ele busca uma relação mais profunda onde, mais do que sexo, se faz necessária uma conexão mental e afetiva que transcende e muito o contato carnal, senão que o ratifica e lhe confere significado. 

Ainda que sinta vontade de prosseguir com esse assunto, por concordar inteiramente com a sua queixa, eu me sinto ainda sozinho e eu mesmo experimento da sensação de não conseguir falar com ninguém. Sinto-me só, mesmo sabendo que não estou e que existem pessoas verdadeiramente preocupadas comigo. Mas ainda me sinto excluído dessa existência, não consigo ver o mundo como as pessoas veem e elas não enxergam nisso problema quando eu me afoito: é um grande problema pois onde elas enxergam a ordem natural, ou ao menos imutável e inquestionável das coisas, eu vejo um caos que deve ser organizado por um esforço intelectual, por uma força que só vir do intelecto humano mas que é ignorada em todas as suas esferas. 

Por isso as conversas partem sempre do imediatismo sensível, as pessoas falam de sexo porque é uma sensação forte, mas é a única que conhecem. Não conhecem a profundidade de outras experiências humanas, como o amor em um gesto de caridade ou a dor da solidão expressa num romance ou mesmo vivida na pele, não conhecem nem mesmo a maldade humana, mesmo que já a tenham visto por aí. Mas, para perceberem essas coisas elas deveriam se livrar de seu imediatismo, e este parece ser forte demais para ser ignorado. Não entendem nem mesmo as profundas consequências que um contato carnal pode trazer. 

Todas as minhas experiências fracassadas de tentar criar um vínculo verdadeiro me foram tão frustrantes que eu terminei aqui, com os braços ao redor das pernas, admirando sozinho o laço forte que unem as pessoas das obras que leio e assisto, laços que são mais fortes do que o imediatismo físico puro e simples. Por isso os inúmeros amigos que antes frequentavam a minha casa, e que brincávamos e conversávamos por horas, hoje não olham na minha cara, e se riem e se divertem sem mim, enquanto eu continuo buscando uma relação verdadeira. Ah, quem me dera nessa vida conhecer pessoas de verdade, pessoas de carne e osso mas também de coração, pessoas que sentem, que se dão e que, mesmo que seja triste, pessoas que se vão. Em nome disso é que prefiro me exilar na solidão. 

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