quarta-feira, 15 de dezembro de 2021

Do próprio vazio

Clarice Lispector disse, certa vez em uma entrevista, que o adulto é triste e solitário. Ela mesma passava por um período difícil de tormentos após o término de uma obra, esperando um desabrochar ou, nas palavras dela, um renascer numa nova obra. Estou falando de meu túmulo, terminava ela a entrevista, com a cerviz séria e semblante cansado. 

Compartilho dessa sua visão, um tanto quanto pessimista do homem que se sente triste e solitário, com efeito sendo essas duas das sensações que mais profundamente estão gravadas no meu peito. Por um lado é bom que o homem sinta-se assim, pois o impele a vida a buscar verdadeira alegria e companhia de qualidade, mas por outro pode levar muitos à perdição de se enganar em prazeres fúteis e aumentam ainda mais a sua sensação de solidão e tristeza. 

Trata-se aqui de uma tristeza profunda, que parece vir do vazio que há no âmago do coração do homem e que ele tenta desesperadamente preencher. Ele pode sentir esse vazio na melancolia de um dia chuvoso e escuro como hoje ou num dia alegre e claro, em nada encontrando companhia, nem mesmo no mundo que o rodeia, estando situado num universo que lhe é plenamente hostil. 

E essa consolidou-se como a minha visão do mundo: pessimista em relação a tudo que esse mundo pode oferecer, ficando a cargo do homem, que dificilmente se esforça para ser o contrário, a tarefa de fazer algo de bom, belo ou justo e mudar a indiferença do universo na atenção do homem individual ao seu próximo.

Mas constantemente estamos ocupados demais para nos importarmos com o outro. A dor que cada um traz consigo é grande demais para ser ignorada e o vazio de cada um clama desde as profundezas para ser preenchido. 

O homem é então um animal solitário, que vive em busca de preencher o seu vazio, raramente encontrando no mundo algo que consiga lhe satisfazer as aspirações mais profundas, não achando razão para ser mas enganando-se nos divertimentos, nas conversas infindáveis sobre qualquer coisas, coisas que silenciem o seu coração angustiado que ardentemente deseja ser preenchido. 

Essa é minha visão, de um mundo que nos é absolutamente indiferente e cujos iguais se tornam tão ou mais indiferentes quanto, na ânsia de cada um preencher seu vazio, vazio esse que é incomunicável e incognoscível ao outro. Estamos isolados em nós mesmo, por isso tristes e solitários, e a única abertura que nos há para mudar nisso é nos abrindo a uma realidade, transcendente, que nos abarca completamente e é capaz de preencher esse vazio. Mas podemos alcançar por nós mesmos essa verdade metafísica? Como não cair de desespero no abismo de nosso próprio vazio?

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