sábado, 30 de novembro de 2024

Aforismos

Talvez não seja você. E nem eu. Talvez conhecer o outro seja algo realmente impossível e que, por qualquer razão, pensamos ser realizável, e não é. Por isso somos assim. Por isso conversamos por anos e sentimos que não conhecemos o outro. Por isso sinto que não conheço o outro. Mesmo me abrindo, sendo transparente, claro com meus sentimentos e intenções. É como se eu sempre falasse sozinho. Porque acho que, no fundo, eu sempre estive falando sozinho mesmo.

Não sei bem explicar aquele impulso, mas foi por apenas um instante, tão ínfimo que, não fosse minha natureza poética dada a observar as pequenas coisas, nem mesmo poderia dizer-se que existiu. Mas apareceu, um brevíssimo aceno na minha mente, o olhei por um único segundo e então desviei a mente para a nota que não conseguia cantar. 

Fui dormir assustado, e instigado, com as provocações de Spare Me Your Mercy, a nova série estrelando Jayler e Thanapob Lee, trazendo algumas questões interessantes. Acabar com o sofrimento e dor de uma pessoa, mas também acabar com sua vida, ou preservar a vida, e prolongar a dor? 

Questão complexa que, não raramente, cai na avaliação superficial, sendo a própria questão, meio incoerente, por equiparar dor e sofrimento com o valor ontológico da vida. Mas eu não sou o mais indicado para dar uma avaliação sobre o assunto justamente porque, reconhecendo o valor da vida no outro, não a reconheço em mim, sendo que defendendo a vida ao outro, eu a nego a mim mesmo, senão que desejo que minha encontre a finitude mais breve possível, antes até da próxima refeição. 

Como disse Rubem Alves, "o que escrevo não é o que tenho; é o que me falta. Escrevo porque tenho sede e não tenho água."

Percebi, uma vez mais, a diferença entre quem decide ir pela vida intelectual e os que os rodeiam. Realmente o homem de estudos não pode esperar ser compreendido pelos outros, ele que precisa compreender. Portanto, o que faz o homem de estudos deve contribuir para que ele se oriente no mundo ao redor. 

Minha cabeça está explodindo da última ciclagem. É sempre essa dor incômoda, e claro que ninguém entenderia se eu não viesse trabalhar por causa disso. É sempre fácil julgar a dor do outro não é? Talvez devesse voltar pro debate sobre eutanásia, mas não, não estou aguentando muito bem, queria poder simplesmente voltar pra casa e dormir. 

Acabei de descobrir que além da famigerada e temida confraternização do trabalho eu ainda tenho reunião, e não consigo nem ficar com os olhos abertos direito. E ainda é sexta-feira, eu trabalho no sábado, e sábado tem evento, e essa semana teve cinquenta dias, e eu não participei do evento que eu queria ter participado, e isso é um inferno. 

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse...
Mas você não morre,
você é duro, José!

Carlos Drummond de Andrade

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