quinta-feira, 29 de abril de 2021

Visceral

Queria não sentir o que sinto por você. Ao cruzar com seu olhar queria poder esconder o que se passa em minha mente, me envergonha saber que você pode ver todas as imagens que pululam em minha mente ao sentir seu cheiro, seu toque. Queria ignorar as borboletas que se amotinam no meu estômago ao mencionar do seu nome, elas se reerguem cadavéricas e putrefatas para me encolher, gemendo e prostrado. Queria não amar você, e queria que esse amor não fosse mais forte do que eu, não fosse uma prisão da qual grito solitário por clemência, que seja a morte a minha libertação. Queria conseguir não me mover automaticamente para o seu lado, queria não segurar o seu braço, queria me afastar de você, extirpando todo desejo, todo sentimento que há em meu coração, como se arrancasse minhas próprias vísceras usando as minhas mãos, penetrando a carne e rasgando meus músculos, derramando meu sangue pelo chão, arrancando as raízes profundas do que você deixou em mim com a mesma violência com que elas sufocam a minha vontade, me reduzindo a um homem que obedece pura e simplesmente a parte mais baixa de sua alma, que se deixa levar pelas potências mais imediatas de sua luxúria, que vive para buscar satisfazer os instintos mais primitivos, que se deixa abalar por um gesto ou palavra que não foi dita, por um afastar singelo, quase imperceptível, uma tendência perdida entre um oceano de intimidades e sorrisos, um espinho que nasceu num roseiral tomado por ervas daninhas.

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