quarta-feira, 22 de março de 2017

Do outro lado da linha

Estou com medo, muito medo, paralisado de medo. Mas não um medo comum, não medo de escuro, não medo de cobras ou aranhas, mas medo de viver, medo de crescer.

Na tarde de hoje recebi a ligação de um colégio particular aqui da cidade, me chamando para um entrevista amanhã a tarde. Não deveria ser nada demais, afinal eu mesmo deixei meu currículo lá, mas de repente foi como se uma injeção de gelo tivesse sido aplicada na minha coluna, e eu enrijeci completamente. Estou agora no escuro, contemplando a tela do notebook, ouvindo Wagner e com os olhos cheios de lágrimas de medo de ter de pensar no meu futuro.

Não sei o que acontecerá amanhã, mas temo que tudo o que eu conheço, todo o meu mundo, se torne diferente, e eu tenho medo desse mundo desconhecido, tenho medo de que não dê conta de viver nele, tenho medo de fracassar. Tenho medo de contemplar o outro lado da linha, de ver o futuro, de ver quem serei amanhã.

Tenho tanto medo de não ser bom o suficiente, de não corresponder as expectativas dos outros que sinto estar sendo sufocado, apertado, espremido contra uma muralha de gelo, prestes a ser esmagado pelo peso desses medos que me impedem de progredir, de crescer, de seguir em frente. 

Ainda nem sei qual será o resultado da entrevista, posso nem ser aprovado, e continuar dependendo de meus pais pra tudo. Mas já não tenho 15 anos, já devia estar trabalhando há um bom tempo. Mas eu tenho medo, há algo em mim que me paralisa completamente só ao menor pensamento de começar a trabalhar.

Não era tão difícil assim quando estava na papelaria, ate porque eu acho que nunca levei aquele trabalho a sério. Mas agora é diferente, é o mercado de trabalho real, com expectativas reais, com metas reais, com cobranças reais, com consequências reais. 

Bem sei que o fato de ter minha própria renda, e adquirir uma independência ainda maior, deveria ser para mim algo bom, instigante, mas não há nisso absolutamente nenhum mérito, ao meu ver. Acho tudo isso extremamente cansativo, e no fim das contas, tudo não passa de morrer de trabalhar para não morrer de fome. Não é exatamente uma perspectiva atraente para mim, muito pelo contrário, é uma realidade assustadoramente podre de um sistema que vai me consumir até a alma, e me descartar, quando não for mais útil. Nem de perto me parece algo bom, mas nem por isso deixa de ser necessário. 

Necessário pois já disse, não posso depender dos outros pra sempre. Meus pais podem morrer ainda essa noite e aí, o que eu farei da vida? Já devia estar trabalhando há muito tempo. Demorei demais pra tentar ser alguém, e hoje não sou nada, nada, nem ninguém. Só um marmanjo mimado que passa o dia ouvindo musica coreana e estudando filosofia na casa dos pais.

Por isso tenho medo, me tornei um adulto sem perceber, nem notei que estava crescendo, e hoje estou, precisando enfrentar de frente um mundo que não estou preparado para encarar. Tenho medo de falhar como homem, como pessoa, tenho medo de fracassar, de deixar as minhas futuras chances escaparem pelo ralo, como deixei as anteriores. Tenho medo. 

Eu não quero ter medo, não quero me esconder, quer poder lutar, vencer, lutar, superar, lutar. Mas só consigo pensar em fugir, em me esconder, em sumir, em desejar o nada, desejar a inexistência, desejar a desesperança. Tudo isso é fruto do medo, esse demônio gordo que me esmaga o peito e me impede de respirar. Por culpa dele eu não consigo evoluir, não consigo crescer e me tornar um homem melhor...

Mas não há o que fazer. Já é tarde demais para voltara atrás, e sou covarde demais para por um fim nisso como deveria. Só me resta caminhar lentamente para a morte certa que me espera ao fim dessa longa caminhada...

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