segunda-feira, 16 de abril de 2018

Sobre as duas vontades

Há uma dualidade quase irremediável no homem. Uma batalha entre dois exércitos travada no campo de seu coração. Dentro do homem duas vontades distintas digladiam-se pelo poder do todo. 

De um lado há a vontade movida pelas paixões. São aqueles impulsos mais bestiais e primitivos que há em cada um de nós. Isso porque em cada coração habita uma vontade natural, que nos faz tender a saciar das formas mais vorazes os instintos que nos apresentam sem que saibamos de onde venham. 

De outro lado há a vontade racional, aquela advinda das reflexões, das reais necessidades. São as decisões que conscientemente tomamos, e os objetivos que traçamos com base nessas mesmas reflexões.  

É um consenso tomar as duas vontades de uma forma quase maniqueísta, apenas dualista. Como se uma fosse boa e a outra ruim. 

Aqueles que se deixam levar apenas pela vontade das paixões costumeiramente se dizem felizes por não serem limitados pelas barreiras impostas pelo racionalismo. Já os racionais tendem a tachar os outros de bestiais e animalescos, pelo mesmo motivo. 

Penso que não há como separar uma da outra. O humano é um ser integral, e não tomado apenas pelas paixões e nem tampouco pela razão. Não penso ser possível reduzir-se tal ao nível bestial que nada de racional reste, e nem tampouco ser tão racional que nada de apaixonado possa surgir daí. 

Não há apenas o preto e o branco, o bom e o mau, mas o mundo em que vivemos é vivido em tons de cinza. Somos uma mescla de ambos, e as vezes um lado se sobressai ao outro, obviamente, mas creio que a única forma de se viver de fato, sem cair no extremo da alienação ou da bestialidade, seja aprender a conviver com ambos os apetites. 

O primeiro é natural, e não pode ser suprimido. O segundo deve ser usado para melhor julgar o primeiro e assim evitar que ambos se anulem e caiamos na desgraça da cegueira. Seja ela apaixonada ou intelectual. 

A cegueira apaixonada é bestial, animalesca. Aqueles que se deixam levar por elas não tem mais controle sobre si, e perdem o direito de escolha para os instintos, que passam a tomar as decisões em lugar da razão. A cegueira intelectual, que assim a chamo por falta de palavra melhor, tem o peso de uma grossa corrente, não podendo tampouco oferecer outro destino ao homem que não seja o da infelicidade. Ambos conduzem a infelicidade, mas o primeiro ainda consegue mascará-la com os muitos prazeres, mas sempre termina na mesma infelicidade, no mesmo vazio. 

Não é o homem uma criatura em constante busca de preencher um vazio que o assusta desde o primeiro pensamento? Essa vazio é o vácuo deixado pela anteposição de ambas as vontades, que se anulam como polos magnéticos invertidos. Quando, no entanto, uma completa a outra, o homem encontra a paz de espírito necessária para então conseguir buscar algo que possa satisfazer o seu vazio. 

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