domingo, 26 de julho de 2020

Da afeição

Amizade é um assunto complicado, ainda mais quando se tem tantos outros sentimentos envolvidos. Quando o carinho supera o limite do querer amigo e se torna algo romântico, como identificar esse limite? Existe um limite? Nós, os carentes, constantemente temos dificuldade em separar as coisas, constantemente cruzamos a linha, e nos decepcionamos com isso. 

Convivo com esse problema, que já faz parte de mim. Não consigo lidar com atenção e carinho sem que meus sentimentos fiquem confusos. De onde vem isso? Falta de afeto na infância? Medo de ficar sozinho, como era quando menor? Eu não sei, mas é só nisso que consigo pensar, mesmo não sentindo que tenha sido uma criança negligenciada ou sozinha. Ainda assim ficar sozinho é meu maior medo. 

Talvez tenha sido superprotegido e por isso temo o dia que terei de enfrentar o mundo sem ninguém segurando a minhão? Isso explica, por exemplo, o motivo de eu gostar tanto de segurar a mão de outra pessoa, de tanto gostar de dormir acompanhado. 

Percebo então a visão que muitos têm de mim: uma pessoa que consegue liderar, alguém sempre com as respostas prontas, alguém para confiar quando algo precisa ser feito, em suma, alguém forte. E talvez eu seja assim mesmo, mas não é assim que me sinto, muito pelo contrário, me vejo como fraco e incapaz. 

" - Você busca seu próprio valor na opinião dos outros. 

 - Cala a boca!

Separação

 - Tem medo de ficar sozinha?

Ansiedade

 - Tem medo de perder sua identidade se os outros a deixarem?

Separação

(...)

Eu não quero morrer. Eu não quero desaparecer. Eu odeio isso. Eu odeio garotos, eu odeio meu pai, eu odeio a minha mãe, eu odeio todo mundo. Ninguém se importa comigo. Ninguém fica comigo.

O que ela deseja realmente?

 - Eu não quero depender de ninguém. Mas ao mesmo tempo eu odeio isso é um sofrimento. 
Eu não quero ficar sozinha, eu não quero ficar sozinha, eu não quero ficar sozinha!

- Não me deixe.
- Não me ignore. 

- Não me mate."*

Uma imagem se repete na minha cabeça, a de uma criancinha sendo abandonada, as pessoas andando sem olhar para trás, e eu no chão, com os joelhos ralados e os olhos marejados. E essa visão me assusta muito. 

No fim das contas é isso, o medo, a ansiedade provocada pela perspectiva da separação, do abandono, que me faz ver amor onde não há, que me faz apegar sem pensar nas consequências, que me torna uma eterna vítima de meus próprios desejos. Sempre apaixonado, sempre sofrendo por alguém que não me quer, sempre me achando indigno de qualquer um e sempre mendigando o afeto. É como se o afeto dos outros fosse o medidor do meu próprio valor, como quase nunca o tenho, a consequência é a completa depreciação do meu eu. 

Daí também resulta a vontade de ficar só, contraditoriamente. A vontade de não precisar de ninguém, de me excluir, até mesmo de sabotar meus próprios relacionamentos, afastar aqueles que me amam para evitar que eles se afastem mais tarde. A vontade de ser frio, de viver distante, mesmo sempre sendo puxado de volta pela menor demonstração de afeto do outro, sempre me deixando iludir, sempre sendo cegado por esse medo que habita as minhas entranhas. 

Por mais que tente descobrir as raízes dessa minha insegurança isso pode me ajudar a melhorar? Atualmente tudo o que consigo fazer é dizer para mim mesmo "você consegue, mesmo sozinho você consegue" e eu preciso dizer isso com frequência pois, a todo momento, uma voz dentro de mim diz que não, eu não consigo, e eu vou falhar. 

~

* Trecho centralizado retirado do penúltimo episódio de NEON GENESIS EVANGELION - O fim do mundo - Você me ama?

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