sábado, 7 de agosto de 2021

Das ironias


Das ironias do meu ser está o querer desaparecer ao mesmo tempo que sou visto por todos, está em querer ficar longe de todos mas tendo todos ao meu redor. É uma tensão cujo palco é meu próprio coração. O querer ser e o não ser, o ir e o ficar quieto, dormir e me manter vigilante, impulsos contraditórios que mostram a autêntica força do meu ser, da minha existência pungente, do meu eu que constantemente se reafirma gritando no coração do mundo como uma fera, uma fera que busca a quem devorar ao mesmo tempo que devora-se a si mesmo, num ciclo interminável, como o ourobouros infinito em si mesmo.

É o querer dormir o dia todo e o querer desvendar a realidade do mundo circundante. É sonhar com uma vida do outro lado do mundo e querer que tudo permaneça como está, é querer ser melhor, mais bonito, como os ídolos da terra da terra do sorriso, tão fotogênico quanto eles, tão pleno, tão... diferente de mim mesmo. E ao mesmo tempo saber que não há como ser outro que não eu mesmo, num desespero humano de ser quem se é e nada mais além disso, de não estar satisfeito e ainda assim não conseguir além disso, de não mudar como deveria e não reconhecer as qualidades que nomeadamente dizem enxergar em mim. 

De que me serve a inteligência que dizem que tenho? Eu nada sei, de mim ou do mundo. De que me adianta o sorriso se não cativo ninguém? É outra expressão da tensão que me circunda, que de certo modo é a chave explicativa de todo meu eu, um eu composto de tensões, contradições, com um vendaval que leva tudo de um lado a outro. 

Eu queria poder voltar ao passado, talvez não me dedicar tanto quanto me dediquei, e talvez prestar mais atenção a coisas que ignorei. Mas eu queria também ir ao futuro, quando não terei mais medo de ser sozinho, quando aqueles que amo já tiverem partido e eu já terei superado o luto. Mas eu também queria estar exatamente onde estou, mas sendo outro, sendo melhor. 

E não, não sei como conciliar tudo isso, não sei reduzir tudo a um único ponto aglutinante, apenas sinto que as coisas assim vão se reduzindo, e tudo aos poucos retorna ao nada. 

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