domingo, 1 de agosto de 2021

Chegando ao Fundo

Durante todo dia ele está lá, um sentimento me espreitando, sibilando baixinho, quase intangível no profundo da minha mente, me ameaçando constantemente, até que chega a noite e, conforme o sol se esconde, ele se revela, maldoso, e começa a me enforcar, enrolando ao redor de mim os seus tentáculos gelados e me levando para o profundo abismo, lentamente apertando meu peito, me sufocando, me matando. A cada noite eu sinto um pouco de mim morrendo, se esvaindo, fugindo ao vento como cinza, rodopiando como farrapos e eu sem conseguir mais correr com os pés sangrentos e o coração comprimido contra o peito, sem conseguir respirar e muito menos gritar, vendo a luz da superfície sumindo e eu sendo cercado pela mais densa e pavorosa escuridão. Me sinto um condenado, sendo aprisionado sem chance de escapar, pois a prisão está na minha mente, ela aos poucos vai se tornando mais real e me matando um pouquinho mais... 

X

A minha mente parece um pouco mais clara, sem o peso que me assombrava dias atrás, não é como se ele tivesse desaparecido mas diminuído, recuado um pouco. O que ficou foi apenas o corpo cansado, incapaz de agir ou reagir, de fato como quem chegou ao fundo do poço. Mas os outros continuam querendo coisas de mim, continuam querendo me ver, continuam me fazendo perguntas, continuam esperando... Como fazê-los entender que não sobrou nada, que eu já estou morto? Pois é essa a verdade, a única, eu já desapareci, ficando apenas meu corpo, uma casca vazia, e esse vazio foi tudo o que restou, recessos do que um dia já foi, alguém que um dia sentiu demais e que hoje não consegue sentir mais nada. 

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