quinta-feira, 5 de agosto de 2021

Duas perspectivas

 "Você se ama? Você realmente gosta de você?"

Não. E nem preciso pensar muito pra dar essa resposta. A verdade crua e simples é que eu me odeio, pura e simplesmente por ver em mim não mais do que um absoluto fracasso, em todas as áreas possíveis. Depois de tanta formação acadêmica eu continuo desempregado e minhas únicas perspectivas de emprego são outros trabalhos como o que já tive: sendo subordinado de imbecis que nada entendem daquilo que coordenam e que ainda assim se acham no direito de mandar em mim. O estudo que tive, e que ainda tenho, de nada adianta em oferecer algum tipo de autoridade intelectual de curto prazo. Por outro lado, os estudos que faço estão ainda muito longe de me oferecer qualquer tipo de autoridade de longo prazo.

Me vejo também um fracassado no sentido existencial, digamos, pessoalmente também. Uma pessoas com os relacionamentos familiares desastrosos, que não fala com a irmã, não ajuda os pais com as despesas, mora numa casa que sequer deveria receber esse nome. Alguém sem perspectivas de um relacionamento amoroso, de amizades no sentido que busco, de pessoas que queiram uma vida plenamente intelectual de busca da sabedoria. Me vejo ainda só, sendo que pouco converso sobre o que realmente considero importante e, considerando tudo o mais banalidade, prefiro não dizer muito. 

Me vejo um fracasso no amor, incapaz de me amar, incapaz de ver pontos positivos em mim, afastando os outros com essa negatividade toda. Feio? Horroroso, horrendo, como os monstros dos livros de ficção que enojam os mocinhos de boa aparência com sua cara repugnante. É assim que me vejo no espelho, e é assim que me amaldiçoo dia após dia, cada vez que vejo meu reflexo. E tudo que eu queria era ser como os meninos que eu acompanho na internet: todos com a pele clara, cabelo liso e perfeito, fotos com uma ótima iluminação, fãs e presentes no dia do aniversário com mensagens de carinho, não um quase intelectual fracassado que toma remédio pra dormir deprimido demais por não conseguir tirar uma foto decente. 

Eu queria ser perfeito como eles, o corpo, o cabelo, o sorriso, a fama... Mas eu não tenho nada disso e isso me sufoca porque, num raciocínio psicótico, sem a afirmação do outro eu só tenho a minha confirmação de que eu não passo disso, um grande fracasso. Daí a enorme dificuldade de responder a próxima pergunta...

"O que há de bom em mim?"

Eu sei que posso dizer que tenho uma inteligência acima da média. As muitas mensagens que recebo de pessoas me fazendo as mais diversas perguntas é uma prova disso. Me chamavam de enciclopédia humana, porque de fato eu gosto de aprender o máximo sobre tudo, pois de algum modo tudo amplia o meu horizonte de consciência e se integra no quadro maior da minha existência, tudo acaba por se encaixar no grande mosaico do conhecimento que eu construo pouco a pouco. As pessoas confiam em mim para responder e isso é bom, elas acreditam em mim mais do que eu mesmo.

Por mais que eu insista em dizer o contrário, em vários momentos eu sei que posso dizer que eu sou bonito. Eu sou bonito. Se me visse de fora diria o mesmo. Tenho belos traços, belos lábios, belas mãos, as tatuagens formam um complemento misterioso e interessante ao conjunto. Eu sou bonito. 

Eu posso não ser um Pavarotti, mas eu tenho um bom gosto musical, conheço músicas de tantas culturas e isso me dá uma visão ampla, que as pessoas muitas vezes ignoram. Eu não me deixo prender por fronteiras, não me fecho num único estilo e isso é bom. Quantas descobertas maravilhosas eu já não fiz? Quantas obras pra vida inteira? O mesmo vale para as séries e filmes que tanto amo. 

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