segunda-feira, 23 de maio de 2022

Castelo de Areia

Os poetas quase sempre têm do seu lado a razão, eles quase sempre conseguem descrever com uma exatidão crua a realidade que os cerca, e aquelas experiências comuns a todos nós, mas que nem todos conseguimos descrever, eles as eternizam em poemas e linhas que se perpetuam e nos ajudam a entender a natureza das nossas próprias vivências. 

Vês então? De fato ninguém é tão importante a ponto de ser insubstituível, muito pelo contrário, o que alguém significa na vida de outro pode, depois de algum tempo, ser ressignificado a ponto de não significar mais nada além de uma lembrança distante, algo que foi um dia e que hoje já não é mais. É verdade que muitas vezes podemos deixar marcas na vida do outro, mas muitas vezes também essas marcas somem como algo que escrevemos na areia e que logo desaparece quando a menor das marés avança sobre a praia. Essa é a tensão que há entre o eu e o outro. 

Vês? Também é bem verdade que ninguém além da ingratidão é nossa companheira inseparável. Os versos de Augusto dos Anjos poderiam muito bem ser tatuados no meu corpo, mas nem é necessário já que diariamente a vida me faz recordar da brutal veracidade desses termos. As nossas quimeras, nossas ideações, aquilo que criamos ao nos apegar ao outro, são brutalmente destruídas pelo próprio avançar da existência, mas apenas a solidão permanece constante, sempre a nossa espero depois de dias cheios e noites animadas. No fim somos lançados na ladeira da memória, esquecidos, e facilmente esquecidos. 

Não somos nada, do pó viemos e ao pó voltaremos, tudo o que passa dessa constatação é arrogância e prepotência que a vida faz questão de destruir como destrói a nossa carne, apodrecendo, retornando ao nada. 

A vida nada mais é do que esse período breve e incômodo, entre sair e voltar ao nada. Somos pequenos castelos de areia esperando pela próxima onda, somos erguidos apenas para voltar a cair. 

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