sábado, 27 de novembro de 2021

O que aconteceu

Não aconteceu nada, não é como se alguém tivesse dito algo que eu não gostei, ou como se algo que fiz não tenha dado certo. Eu simplesmente não quero esse dia, não quero ficar acordado, não quero conversar, não quero nada além de ficar deitado, além de não pensar, além de não ser. A experiência de suspensão da minha consciência tem sido minha única experiência válida. A única coisa que tem feito meus dias valerem a pena, além das histórias de amor, são os momentos que não preciso ser, que posso apenas dormir, sem pensar em mais nada. 

E queria que fosse sempre assim, que eu não precisasse ver o amanhecer de outro dia, de outro dia terrível, ou o anoitecer de uma noite de pesadelos e pânico. 

Também queria que tivesse em mim alguma energia, mas parece que há muito eu venho operando na bateria reserva. Eu vejo belas maquiagens na internet e gostaria de melhorar, tentar reproduzir, mas eu não consigo, me vem um desânimo total e eu não consigo erguer um pincel sequer, quem dirá reproduzir algo complexo, mas belo, que me deixaria contente pelo esforço. Eu não consigo. 

Quantos livros ainda faltam ser lidos? Mas em alguns dias eu sequer consigo entender umas poucas frases e logo largo de lado aquelas páginas tão cheias de ideias que já não consigo entender, a mente ocupada demais perdida em devaneios, perdida no vazio. Eu não consigo. 

Eu me sinto vagando num mundo de névoa, sem conseguir enxergar, sem saber para onde ir, eu vivo buscando ajuda, procurando, olhando de um lado para outro, mas eu não vejo ninguém. 

Todos perguntam o que aconteceu. Mas nada aconteceu. É como se uma chavinha fosse virada no meu cérebro e eu simplesmente fico assim. É sempre assim. E de repente tudo muda, tudo se torna opaco, e até sair da cama se torna um suplício. 

Quantas vezes eu já falei sobre isso, e nada muda, exorcizo esses fantasmas mas eles logo voltam pra me assustar. Eles continuam me rodeando como o leão procura a quem devorar. E eu me sinto lentamente devorado, minha carne estraçalhada, meus ossos reduzidos a pó. Pó. Eu sou pó e ao pó voltarei, sendo melhor ser pó e rodopiar ao vento como farrapos do que viver, ou melhor, do que subsistir em cima de uma cama, sem vida, sem vontade, sem forças. Padecendo o tempo que passa sem conseguir agir. Sendo apenas vítima inerme do tempo. Vítima. Apenas vítima. Passível. 

Por mais que eu sinta que o tempo passa de modo desperdiçado quando faço isso, dormir o dia todo, eu não consigo deixar de pensar o quanto é bom acordar e ver que não precisei passar a tarde toda inventando um pretexto pra ficar sóbrio. Eu prefiro fugir e sei que as consequências disso são desastrosas pra minha saúde. Mas eu simplesmente não consigo me forçar a ficar acordado todos os dias. 

Ainda que desperdice meu tempo é mais fácil do que viver cada dia, sendo cada dia uma tortura, é melhor não viver. 

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