segunda-feira, 15 de novembro de 2021

Uma Playlist


1. One Last Kiss - Utada Hikaru
2. Beautiful World (Da Capo version) - Utada Hikaru
3. Komm Susser Todd (Come Sweet Death) - Arianne
4. Mango From The Wrist - Takayan

Os acordes iniciais da versão Da Capo de Beautiful World, parte da trilha sonora de Evangelion 3.0+1.0 Thrice Upon a Time, por Utada Hikaru foi um dos grande presentes da música nesse ano de 2021. Na verdade toda a faixa é de uma beleza ímpar, e as versões anteriores já eram boas o bastante mas essa conseguiu beirar a perfeição. Em matéria de Jpop essa com certeza é uma obra prima. 

Uma boa escolha pra um dia preguiçoso como este, feriado na segunda, um pouco de ressaca depois do fim de semana mais cheio do que eu gostaria. A mente ainda em branco, sem se ater a nenhum aspecto realmente sério do ser, prefiro me manter à margem da existência e contemplar o universo com a cautela de um animal que experimenta entrar num território desconhecido. 

Em dias assim a beleza tem papel todo especial nessa contemplação, é ela que dá o tom das cores que meu coração vai imprimir no meu humor, por isso a minha escolha de hoje pelas faixas curtas do Jpop que exploram as vozes doces e os acordes criativos de um povo cuja música reflete o colorido da sua cultura. Japoneses tem um dom especial pra faixas, sejam elas baladas ou mais animadas, que contenham uma boa dose de experiência humana real condensada em poucos minutos de voz acompanhadas de orquestras inteiras ou de um simples piano. 

Seguindo na playlist tem ainda a faixa complementar a anterior, One Last Kiss, também de Utada Hikaru, algo sobre o amor verdadeiro enevoar toda e qualquer outra beleza que se apresente ao coração do homem. O amor presente naquele último beijo é então maior que tudo o resto, há beleza aqui também, na demonstração das relações profundas, daqueles encontros de almas, aquilo que de falavam os escolásticos na fórmula Idem velle, idem nollem, querer as mesmas coisas e rejeitas as mesmas coisas, encontrar-se no outro como que num reflexo e assim não se completar, somos seres que só se completam em Deus, mas somar-se ao outro e nos tornamos um todo maior que a soma das partes. 

É essa beleza que me dá forças para levantar hoje, em cujos compassos se tornam como que chamarizes ao meu corpo inerte na cama e prestes a voltar pra lá. Sem estar realmente preocupado ou pensando em alguma coisa. 

Chegando ao fim, a penúltima faixa, embora cantada em inglês, continua seguindo o padrão das outras duas. Tendo sido lançada muitos anos antes ela reflete um sentimento constante no meu coração: a vida efêmera e dolorida que somos obrigados a enfrentar. O adágio que eu repito tantas vezes, e que tatuei no meu corpo, "E tudo retorna ao nada" é um retrato do desespero que o homem pode encontrar ao deparar-se com a verdade da morte, em comparação com seus desejos e orgulhos as coisas ainda desmoronam de um jeito ou de outro, e nos resta o desejo de voltar no tempo, a sensação de que morremos por dentro. Experiência humana brutal, abissal, de forma quase crua, não fosse a faixa um jazz que se contrasta com a letra pessimista da doce vocalista que repete sem parar que tudo retorna ao nada e que tudo começa a desmoronar. 

Hoje é esse dia, de contemplar a experiência humana em sua crueza, sem perder o encanto que traz a beleza consigo em cada uma delas. E é por isso que eu levantei da cama hoje, mesmo com resquícios da minha última crise de depressão, levantei graças a beleza que me conquistou. 

Por fim, finalmente, escolhi o colorido de Takayan em tratar de uma coisa tão séria e pesada com uma leveza impressionante. A faixa não romantiza a depressão, não fala bem da automutilação a qual nós nos sujeitamos com frequência, ela fala do ponto de vista do desespero, desespero que muitas vezes nos faz rir de nós mesmo num acesso de humor autodepreciativo que reflete, na realidade, a destruição da mente em questão. outra experiência humana poderosa, a vontade humilhada, o desespero frente a realidade. Uma boa escolha pra terminar a audição de um modo inesperado, quase esquizofrênico, realçando o caráter ambivalente dos sentimentos humanos. 

E agora, quando os remédios começam a fazer efeito eu decido que é melhor encerrar a reflexão por aqui. Se alguém quiser ouvir as faixas que eu sugeri saiba que elas fazem parte do círculo mais íntimo das minhas experiências e, mesmo que alguém discorde completamente de mim, isso não mudará a importância que cada uma delas teve num momento da minha vida. É apenas expressão de impressões, das minhas experiências humanas profundas. Como a imagem que escolhi como capa, uma pessoa, numa miríade de cores que se contrastam entre si mas que compõem um único elemento: o ser. 

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