segunda-feira, 29 de novembro de 2021

Prece

Uma das preces dos fiéis da liturgia de hoje dizia o seguinte: "Pelos que, pela dor e desilusão, já não esperam nada e nem ninguém, para que acreditem nas promessas do Senhor, oremos." E, no instante que foi lida eu senti um choque pois as palavras caíram como uma espada sobre mim. 

Como num estalo eu percebi, naquele momento, que eu não espero por nada, que eu não espero por ninguém, que minha vida é completamente vazia de esperança no amanhã e que eu não tenho absolutamente nenhuma perspectiva de futuro. 

Isso me desceu com um gosto amargo na boca. E essas palavras da prece reverberaram em mim durante todo o dia, num contraponto interessante com o otimismo que eu senti ao ver os últimos episódios de uma série coreana que estava acompanhando, Hometown Cha Cha Cha, cuja mensagem final foi justamente "viva a vida intensamente, aproveite cada dia, sonhe e realize seus sonhos pois há muita coisa boa pra ser vista". 

Essas duas visões se mesclam no meu ser. A visão que não crê, não espera e não vê no mundo nada de bom e a visão que enxerga numa história como essa motivos pra me levar às lagrimas. Ou talvez eu tenha chorado justamente por encontrar lá a esperança que não encontro em mim mesmo, o que falta em mim, o vazio absurdo que consome meu peito. 

Como podem duas realidades tão distintas coexistirem assim dentro de mim? É como água e óleo, não podem misturar-se e, no entanto, estão ao mesmo tempo, embora em proporções distintas, mas colidem e coabitam, como serpentes que tentam se devorar. E elas lutam eternamente, uma ganhando a cada dia mas a outra ressurgindo novamente e reiniciando o ciclo infinito. 

Viver a vida, uma bênção, um dom divino. A existência é só dor e caos e não há sentido algum em todo o sofrimento que passamos. Há beleza para ser vivida, esperanças que valem a pena, sonhos que merecem ser sonhados e realizados. Há apenas a morte como libertação dessa imensa roda de ódio em que estamos presos. Há uma vida eterna no fim de tudo isso que faz valer a pena. Não há nada que possa trazer sentido a essa existência miserável. Há beleza. Há o caos. Há um fim nisso tudo. Tudo é apenas morte, o desespero é a única realidade. 

E tem a mim. Pobre. Perdido no meio dessas visões, é onde me encontro, e minha alma está em agonia.

"Preces meae non sunt digne, sed tu, bonus, fac benigne, ne perenni cremer igne."

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