quarta-feira, 19 de janeiro de 2022

Aforismos

Eu odiei aquela foto, e mesmo assim a postei, mas odiei e continuo odiando cada vez que a vejo. Meu corpo gordo, disforme, feio, nem as muitas tatuagens foram capazes de desviar o olhar para todos os meus defeitos. Eu odiei me ver naquela situação. Isso aumenta em mim a resolução de que eu preciso mudar, sejam exercícios ou dieta eu preciso mudar ou a minha autoestima não terá jamais recuperação. E olha que já me encontro no fundo do poço, sequer conseguindo me ver no espelho. 

X

A música que toca agora eu já não ouvia há tempos, é o álbum Fiction and Fact do grupo B2ST, um dos meus favoritos e a aura que ele traz é de nostalgia, de tantas e tantas vezes que eu o ouvi e que ele foi causa de intensa alegria. Posso reviver um pouco dessa alegria nesse momento, parece que as trevas recuaram um pouco, certamente efeito do longo sono que tive essa tarde. Me lembro das trevas intensas em que estava ontem, parecia que não teriam fim... E embora eu não esteja completamente bem hoje eu já consigo ver novamente a luz. 

E é nessa dualidade que eu vou vivendo, o tempo todo, em alguns dias no mais completo deserto, sem ver a luz, e outros dias na clareira de um belo jardim. Em alguns dias bem, com a autoestima até razoável, em outros apenas escuridão. 

X

É como se o sono me dominasse por completo, como se não houvesse vida para mim fora do sonho. Mesmo me esforçando para ficar acordado alguma coisa em mim implora pra que eu volte pra aquele mundo de torpor, pra que eu apague, e eu não consigo resistir. Não consigo pois o sono é a melhor parte do meu dia, o sono é minha única tranquilidade. Até mesmo escrever essas palavras me custam a manter os olhos abertos, e eu anseio pelo abraço caloroso do deus do sono que vem me trazer a paz, finalmente. 

Como pode ser algo tão bom e assustador ao mesmo tempo. Ao passo que o sono me oferece a tranquilidade que o mundo furtou de mim eu sinto que ele me rouba também a própria vida, que deixo o tempo passar enquanto durmo, mas mesmo assim não consigo fugir de seu abraço apertado. É meu céu e minha perdição. 

E a ele eu me entrego completamente e sem reservas, me entrego de corpo e alma e nesse lago profundo mergulho, com o alento de uma música lenta a sumir enquanto afundo e não mais vejo a luz. Dessa vez no bom sentido. Para onde mais eu fugiria senão para tão dentro de mim que nem mesmo eu me encontrasse? Para uma pessoa como eu a fuga é a única alternativa. E não me julgue, eu não sou forte como você para enfrentar o mundo de frente. 

E não tendo forças sequer pra levantar da cama como queríeis vós que tivesse força altaneira para enfrentar avidamente meus inimigos mais cruéis. Não eu os deixo me devorar cada um, vermes a apodrecerem o meu cadáver ainda vido, e a roer-me os ossos até o tutano. Achei que, se dormisse, acordaria melhor, mais disposto, mas eu estava enganado.

A música tem aqui um papel de destaque: ela embala o sono até as profundezas mais abissais, ela corta os vínculos com o mundo exterior, de barulhos e incômodos. Ela é a ponte que me liga da realidade ao mundo onírico em que me refugio. Aqui a musica clássica e a coreana tem um papel especial: a profundidade dos sentimentos que elas conseguem transmitir são exatamente o que eu preciso pra romper com a realidade. Por isso as minhas playlists estão cheias delas, são elas que me tomam pelas mãos e me colocam carinhosamente na alcova preparada pelos remédios, onde repousarei finalmente. 

"Eu dormia, mas meu coração velava." (Ct 5, 1)

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