Essa tarde não será vivida
passarei nos braços do deus do sono
cujo amplexo é o de meu amado
A noite quem sabe despertarei
para de Nix ver o reinar
mas outra vez a Hipnos hei de abraçar
Quem ousaria me dizer o contrário
que essa vida vale a pena ser vivida
se das minhas dores só as sinto eu
e só eu sei o que vi da vida?
Ébrio de sono eu torno a minha alcova
lânguido e escuro, e sobre o cair da tarde
meus lábios murmurarão em sussurro:
Essa tarde não merece a vida.
Até outro dia quem sabe
em que obrigado a ser desperto eu seja
e obrigado a enfrentar a vida
eu peleje contra a morte
Sendo que da morte eu vejo o manto
já há muito me cobrindo a face
mas deixando de fora minhas mãos
e é por isso que ainda não adormeci de uma vez por todas
Compassos e ligaduras me fazem companhia
sopranos e contraltos cantam a minha poesia
e eu adormeço lentamente
nos braços de toda essa sinfonia
Do zolpidem a sugestão
o abraço apertado das gotas de rivotril
ao leque refrescado da ciclobenzaprina
ao sono leve da dexcloferniramina
Meus companheiros vão comigo,
para a terra distante, onde sonharei com o Eros
e o deus primordial me ensinará os segredos
do amor que constituiu o mundo e a mim
De todo esse mundo me despeço
e a música é a minha última companhia
que da minha quimera assiste o enterro
sem outra luz nem guia.
O melhor a se fazer é ir me deitar
antes que do coração o ímpeto incontido
se manifeste a declarar
Antes amarrar-me a dopada candura
que mais humilhação buscar
De todo esse mundo me despeço
e a música é a minha última companhia
ao jardim fechado me conduzindo
e ao peito florido do amado me deitando.
Nenhum comentário:
Postar um comentário