quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

Uma voz


"Sede sóbrios e vigiai. Vosso adversário, o demônio, anda ao redor de vós como o leão que ruge, buscando a quem devorar." 
(1Pd 5, 8)

Pouco a pouco eu vou conseguindo identificar os sinais, conforme vai se aproximando a noite escura a sensação de pânico se torna crescente. É como um relógio, uma contagem regressiva, que se ativa na minha cabeça e a cada tic-tac parece que eu vou me aproximando mais do fim. 

Mesmo sabendo que ele não vem é como se viesse, e esse prenúncio macabro é como o crescendo de uma orquestra, que vai aumentando lentamente até tomar todo o salão numa apoteose vigorosa, sendo a apoteose o momento mais crítico, aquele em que o desespero está me dominando por completo, me destruindo na mesma velocidade em que cresce e se espalha. 

Mas, ao contrário da orquestra, a música que toca não é bela, antes disso, é uma valsa macabra que anuncia a minha morte. 

Percebi que isso piora conforme a crise depressiva se aproxima, e se agrava ainda mais quando ela chega mesmo, naqueles dias em que eu já não consigo ver a luz. 

Em alguns dias, como ontem por exemplo, mesmo chateado eu ainda via a luz, meu corpo ainda respondia aos meus comandos, eu conseguia andar, falar, responder, conviver. Mas em outros dias, como começa hoje, eu vou me afogando num oceano que me engole, afundando lentamente, até que a luz na superfície desapareça. 

As vezes eu escuto uma voz, dizendo que vai ficar tudo bem, mas como a luz ela vai ficando mais distante, e cada vez mais vai sumindo até que eu não escute mais, e então ela desaparece e dá lugar a outra voz, e eu não tenho coragem de repetir aqui as coisas que ela me diz. Eu só queria que ela sumisse, mas ela só é silenciada brevemente, e logo depois retorna, e fica atrás de mim o tempo todo, me ameaçando, anunciando a minha morte. 

E eu fico a espera pois se ao menos morresse a voz cessaria.

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