sexta-feira, 4 de março de 2022

Em dias como esse

Estou em estado de devaneio permanente. Não consigo me concentrar no que realmente deveria. A voz do meu professor é apenas uma trilha sonora de fundo para os meus pensamentos distantes, até a mancha de infiltração da parede é mais interessante do que as letras do livro que eu, em vão, tentei ler. E minha mente voa livre, sem se deter em nada. 

Visito igrejas distantes, escuto trechos de cantos solenes e de marchas de carnaval, poderia muito bem dizer que uma procissão está passando pela minha rua entoando trechos de músicas pop famosas. Minha mente está um caos, e eu não posso recorrer aos remédios mais uma vez essa semana, eles já nem fazem mais efeito. 

Até os calmantes perderam seu poder, porca miséria, e agora o que eu vou fazer da vida se não consigo me concentrar e nem tampouco dormir? Eis uma prova irrefutável de meu fracasso como existência. 

Passei em frente ao espelho e toquei meu rosto, minha pele grossa como a casca de uma árvore, os produtos de cuidados faciais há muito abandonados no meu armário. Não há esperança pra minha pele como não há pra minha alma, meus vícios tomam conta do meu ser, me fazendo despertar como fera, guiado apenas por meus instintos mais primitivos. 

Minha mente está confusa, acho que isso é o que significa, e eu já nem sei mais o que é ter uma mente coesa, há muito as palavras perderam seu significado e se embaralham na minha mente, quisera eu ter aquela sistematização escolástica na minha vida, que tudo fosse um tratado lógico milimetricamente escrito, mas  não, as coisas são caóticas demais e, quanto mais eu penso nelas, mais caóticas elas se tornam. 

Não sei quem sou e nem para onde vou, nem sei se vou para algum lugar, paralisado pelos meus pensamentos, perdido na selva que eu mesmo criei mas que cresceu sem meu controle até me sufocar, até me aprisionar. 

O barulho alto da máquina de costura me incomoda, detesto tudo que faça barulho demais, parece que ele se soma ao barulho da minha cabeça e tudo vira um caos. 

Tentei mudar um pouco os ares da minha leitura, o sofá da sala ao invés do meu quarto, mas a poeira na mesa de centro parece mais interessante e eu não consigo fugir a vontade de ficar atualizando a timeline do Twitter o tempo todo, mesmo sabendo que nada lá pode me interessar. 

Existem algumas verdade bastante inconvenientes nesse mundo, penso, como por exemplo o fato de que realmente é preciso comer bem e fazer exercícios para emagrecer e que essas coisas ajudam a saúde mental tanto quanto os remédios e eu acho isso uma droga. A vida é uma droga não é mesmo? Tudo o que eu pedi era um pouco de sono e um corpo melhor, mas o espelho me mostra uma camada de gordura na região da cintura e uma mancha abaixo dos olhos que me dizem que eu não posso ter nem uma coisa e nem outra. 

Um mundo onde poderes existem e a realidade não é tão enfadonha, tão chata, onde a rotina não nos engula. Em dias como esse eu tenho vontade de desistir de tudo, em dias como esse eu só queria desaparecer. Não ouvir nada sobre guerras e epidemias, sobre falsas amizades, sobre obrigações que eu não queria ter. Em dias como esse eu odeio meu corpo, odeio minhas falhas, odeio a minha consciência. Odeio tudo que não seja o ideal de beleza e perfeição que me venderam e que eu prontamente acolhi como verdade de vida, mesmo sabendo que não é verdadeira eu ainda desejo, desejo a perfeição, desejo uma vida melhor, desejo algo mais do que essa sucessão de desencontros.

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