sexta-feira, 14 de julho de 2023

A molhar o solo

É como se começasse a chover por conta do calor intenso que emanava do meu corpo. Eu realmente tive me esforçar muito para fazer acender uma chama que, em alguns dias, parece ter sido extinguida. Mas, de algum modo, por entre as pedras frias da praia castigada por ares violentos, encontrei uma pequena fagulha, uma centelha mínima que, de repente, conseguiu se transformar num grande incêndio. 

Aquela posição não me seria vergonhosa, me surpreende que nunca tenha tentado sozinho, afinal a minha solidão é mais do que uma condição imposta de fora por um universo indiferente e homens mais indiferentes ainda, é agora um mundo ao qual eu pertenço e ao qual não pretendo sair, então é normal que me acostume com essa versão que, até então, só outros tinham nos dias em que dava vazão ao meus instintos mais primitivos. 

Olhando pela janela eu via uma noite fria lá fora, em alguns momentos o vento fazia dobrar as folhas do mangue mas, ao meu redor, o ar estava inebriando do meu suor, dos meus gemidos baixinhos e do cheiro luxurioso que meu corpo desprendia enquanto ajoelhado ou de quatro, com as pernas abertas como que pronto para receber alguém dentro de mim. Tinha certeza que, naquela hora, dentro de mim havia como que um Vesúvio e que minhas entranhas tinham se transformado em lava prestes a consumir e tornar em cinzas qualquer um que ali entrasse. Eu tremia e apertava meus próprios lábios que pareciam responder com sangue aquele carmesim que crescia cada vez mais e, começando a brilhar, pulsava e não cabia mais em si mesmo. 

O resultado foi o tecido vermelho, não propositalmente escolhido na emergência daquela avulsão nívea, manchado como se tivesse sido ele a testemunha da fecundidade daquela chuva que, lá fora, molhava o solo pela enésima vez.

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