quinta-feira, 20 de julho de 2023

Diálogo sobre o Amor, a descida de Dante

 - O que você acha que aconteceu quando um casal de namorados, que são católicos fervorosos, terminam o namoro?

- Eu não tenho ideia, sinceramente. Eu não sei nem mesmo porque daria certo! Acho que apenas amor não é suficiente, eu mais do que ninguém sei que amor não é o suficiente.

- Eu penso que um namoro deve ser pra conhecermos o outro e sermos fonte de melhora para o outro. Amor eu penso mais já num casamento. Ambos precisam querer melhorar, primeiramente pra Deus, pois desse modo estariam também melhorando pro outro. Mas o que você pensa sobre isso? O que eu penso parece um pouco utópico. 

- É exatamente isso, ambos precisam querer melhorar, mas até que ponto os dois estão dispostos a isso? Por isso as coisas não dão certo. 

- Como assim?

-  Até que ponto ambos querem melhorar para Deus? Até que ponto os dois vão aceitar os filhos que Deus mandar? Até onde suportar as limitações do outro? E as dificuldades como traição e outros vícios? Caminhar junto não quer dizer que os dois não vão ter vícios, um pode superar a infidelidade em meses e o outro pode demorar anos. Um pode se irritar facilmente e o outro pode ser impulsivo, até onde o primeiro vai conseguir ser paciente e o segundo conseguir se refrear? Ou até que ponto eles vão se ajudar? Claro que é bonito e muito virtuoso ser paciente e suportar por amor e com amor, mas na prática é diferente, não encontramos virtude em todos do mesmo modo.

Acho que o que você entende por amor, como eu entendo, inclui esse esforço em compreender, suportar e lutar com o outro. Fazendo eco aquilo que São Paulo disse, que "o amor tudo suporta." Na prática as coisas são bem complicadas e, sendo essa afirmação do Apóstolo dos Gentios uma afirmativa geral, é na particularidade das situações, e nas suas dificuldades, que ela se aplica. 

Claro que duas pessoas com visões parecidas e objetivos parecidos vão conseguir se entender melhor, isto é, se duas pessoas ao se conhecerem já querem filhos numerosos, uma família próspera, é mais fácil que ambos mantenham esse pensamento quando surgirem as dificuldades dos primeiros filhos. Isso porque existe uma diferença, visivelmente sutil, nas formas de demonstração do amor. 

Quando um homem pensa numa mulher apenas para a formação da família ele já está usando-a, ela se torna um meio, ele não está se aproximando verdadeiro a ela, mas sim ao seu ideal criado e alimentado. A família é, nesse sentido, continuação natural do amor genuíno que nasce de ambos. Até que ponto consegue perceber isso? 

A demonstração do amor é também outro fator. Você sabe que eu considero o afeto de modo físico uma das demonstrações mais genuínas, mas no nosso caso nós dois expressamos amor de formas diferentes. Não poderíamos namorar, não poderíamos nos beijar, tudo isso também se aplica aos outros casais e, na convivência do dia a dia essas coisas vão se tornando verdadeiras provas. 

É belo ver o amor como algo que tudo suporta, realmente belo, mas na realidade quantos estão dispostos a realmente suportar tudo? Você perdoaria a traição? Perdoaria a violência? Perdoaria os vícios do outro? Até mesmo ao pensar nisso é fácil dizer que sim, que tudo suportaria por amor, mas no dia a dia, naquela crise depressiva, quando não acordamos bem ou na crise financeira, nas dores da doença dos filhos, na aparência do outro... O amor precisa ser constantemente redescoberto e alimentado.

Por isso que, e aqui eu encerro a parte cristã da coisa e inicio uma visão mais pessimista, ou realista, que eu tenho: o amor me parece tão complicado que eu já não consigo crer que ele exista. É um conjunto tão intrincado de valores, exige tanta força, tanta compreensão que me parece ser uma invenção quase absurda. Bela, é verdade, mas a experiência me fez perder a esperança nele, como comecei dizendo: eu acho que o amor não é suficiente, ou melhor dizendo, não somos suficientes para amar. Sempre faltará algo, sempre algo estará em desencaixe e, por mais que o amor esteja presente na superação desses problemas, a dor que ele causa é maior do que tudo o mais. Mas é claro que essas são palavras amarguradas e que não devem ser levadas em conta. 

Um comentário:

  1. Não tive uma educação cristã, mas uma de esquerda. Logo, sempre que leio qualquer descrição ou conceito que o cristianismo faça, questiono-me profundamente.
    É evidente as adversidades que um relacionamento pode causar, mas a escolha da forma em que lidam com ela parte, ou deveria, de uma escolha pessoal entre aceitar ou negar, e não de uma escolha cristã universal de somente aceitar em nome de Deus e ponto. Acho engraçado, mas respeito, obviamente. Acreditar em coisas invisíveis sempre me pareceu mais cômodo, fácil e confortável; o peso da obrigação e da culpa são pesados demais para uma pessoa, eles devem se apoiar a Deus - e estão certos, é a esperança que se tem da vida.
    Por mais que eu tenha essa visão, acredito em Deus, vou na igreja católica, terreno e centro espirita ( só não vou na evangélica por questões morais mais profundas); apresento contrariedade em todos os aspectos da vida. Questiono fielmente a existência e todo dogma cristão, mas não deixo - NUNCA - de orar a noite. E tudo isso, é evidente, decorre de uma dependência que tenho a Sto Antônio, Oxalá, Xango e Deus. Todos eles - ou elas - fazem-me dependentes de sua existência.
    Classifico o termo dependência como tudo aquilo que causa uma coisa e seu adverso: alegria X tristeza, prazer X desprazer e fé X questionamento. Depende-se deles pois o fator positivo( a fé no ideal que traz entendimento da própria existência, o amor que enche o espirito de paixão etc) faz com que nossa vida se torne leve, boa e espirituosa. Como dependência, essas coisas carregam o sofrimento, questionamento e desamor. Somos dependentes por precisar de sentido, pessoas, sentimentos ou bebidas; precisamos nos preencher com vícios, virtudes e consciências. Porém ,com todo preenchimento, há o vazio inevitável, o vazio que em algum momento nos damos conta , que nos cerca, e nos arrebata esporadicamente. Somos dependentes químicos, viciados em pessoas ou simplesmente vazios demais para aceitar um universo com tantas oportunidades de pensamento.
    Sobre ''O que você acha que aconteceu quando um casal de namorados, que são católicos fervorosos, terminam o namoro?'', a resposta mais lógica, cabível e aplicável é: Muita fofoca no intervalo da missa, boatos sobre o fim (quase sempre ligados a promiscuidade e traição) e , é claro, olhares de canto para o ex amado(a) , junto com um ciúme que só vai embora quando achar outra filho(a) de Maria para amar. De qualquer forma, a vida é boa demais para gastar com dogmas vindos de um tempo medieval; viva a modernidade e poder dar a mão para um não-futuro-marido, beber até esquecer o nome e ir em bares de qualidade duvidosa.

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