quinta-feira, 12 de setembro de 2024

Nos umbrais

At The Park Gate”,  John Atkinson Grimshaw

"Procuro sempre o silêncio. Sou um feixe de opostos e só consigo suportar-me quando me considero um fenômeno objetivo." (Carl G. Jung)

Admito que, quando o assunto é o coração, o meu realismo vai pelos ares. Nesse exato momento eu não sei dizer o que é coisa da minha cabeça e o que é percepção do real. Tudo que sinto é um afastamento gradual. Como tantas vezes no passado eu vejo o afastar, eu vejo aquelas costas diante de mim, e vejo o espaço entre nós cada vez maior, se estendendo infinitamente. 

Como dizia Pascal "a solidão desses espaços infinitos me apavora"

Sim, me apavora, me faz gemer prostrado, chorar silenciosa e copiosamente. Me apavora saber que, pouco a pouco, vou ficando completamente só de novo. 

Morri várias vezes nas últimas noites, mas ninguém o soube, nem mesmo você. Morri sozinho, entre lágrimas e a agitação ao meu redor. E acho que hoje, nessa noite, morrerei de novo.

Recordando então meus últimos dias, faço reverberar as palavras de Rubem Alves: 

"A morte deveria ser como os últimos compassos de uma sonata: belos e tristes, até que venha o silêncio."

A minha escolha diante disso, de mais uma despedida, é a mesma que sempre tive: ficar parado, impassível, sendo perfurado em meu coração por uma lança, que sangrará enquanto ninguém a vê. 

Nesse exato momento eu não sei dizer o que é coisa da minha cabeça e o que é percepção do real. Ainda que eu não saiba sair de uma situação, de algum modo ela vai sair de mim. Se não sei o que devo fazer posso escolher não fazer nada, e ficar justamente parado, enquanto ele se afasta lentamente de mim, sumindo no horizonte e eu aqui, nos umbrais da solitária existência. 

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