sexta-feira, 13 de setembro de 2024

Sociedade e Solidão

Sergey Galanter

"São muitos os caminhos pelos quais Deus pode nos conduzir à solidão e levar-nos a nós mesmos." (Herman Hesse)

Não consigo me sentir confortável com essa cultura dos aplicativos de namoro/pegação. Ainda que entenda que, algumas vezes, só queremos saciar uma vontade urgente e nada mais, dificilmente eu consigo me satisfazer com isso. Com efeito, o próprio sexo é sem graça sem aquele aporte sentimental por trás, nunca senti realmente algum prazer nisso. Mas, quando buscamos alguém para conhecer melhor, caímos inevitavelmente numa série de armadilhas perigosas: a primeira é o ambiente de banalidade que frequentamos. Estamos habituados à cultura de açougue em que escolhemos o que comer, ao buscar uma amizade ou algo mais continuamos a seguir essa lógica, ainda que inconscientemente. 

Muito já foi dito sobre isso, o próprio Zygmunt Bauman inaugurou uma escola inteira que se baseia na superficialidade das relações e, bem, acho que todos nós já tivemos algum tipo de experiência com isso. Todo mundo já começou uma conversa e, do nada, a coisa foi esfriando ou simplesmente pararam de responder. Isso porque estamos todos sempre em busca do melhor: vemos um cara com a barriga chapada no Instagram e achamos que ele vai ser melhor, a autoestima é um fator definitório, já que em verdade todos desejamos um amor desses de série, em que o homem lindo e perfeito se apaixona pela pessoa considerada feia ou pobre. 

Não minto, eu sou igual. Imagino histórias inteiras de amor com estranhos no ponto de ônibus, e não enxergo ninguém ao meu redor que possa, minimamente, criar algo assim. 

Outro dia vi algo na internet também que fez todo sentido: se referia ao fato de que temos de ter consciência daquilo que fazemos e de onde estamos. Eu muitas vezes me pego querendo o corpo perfeito daqueles atores tailandeses que sigo com tanto afinco. Mas eles todos fazem uma ou duas horas de academia todos os dias. Eu não. Eles seguem dietas rigorosas. Eu não. E por isso, em pouco tempo, eles podem ostentar corpos perfeitos. Eu não. Então essa consciência é também importante, porque vale para a forma como tratamos o outro e nós mesmos.

Como eu posso esperar um homem perfeito se eu me odeio sobremaneira? Quantas vezes eu mesmo perdi o interesse em conversar e sumi, e quantas vezes fizeram o mesmo comigo? Todo mundo quer alguém gostoso, que responda rápido, inteligente e trabalhador, mas que tenha tempo para dar atenção na medida certa, sem ser pegajoso e sem ser lacônico. Mas quantas vezes partimos pros aplicativos e agimos como quem procura carne? 

E a cada dia se torna mais e mais difícil criar conexões. Eu não saio, não frequento baladas, e as pessoas da igreja não parecem muito a vontade em me conhecer, nos aplicativos eu mesmo estou cansado de tentar conhecer alguém, eu ou ela perdermos o interesse no terceiro dia, porque não correspondem aos nossos ideais, porque a pessoa não gosta das exatas mesmas coisas que o outro ou porque não têm a mesma posição... Enfim, a superficialidade de nossas relações é inversamente proporcional as nossas expectativas, não refletindo nossas ações.

E seguimos, vazios, sozinhos, ocasionalmente procurando alguém para fazer sexo, e seguindo decepção atrás de decepção. É preciso, no entanto, aprender a ser sozinho num mundo onde está cada vez mais fácil comunicar-se com o outro e que, ainda assim, está cada vez mais difícil entender o outro, enxergar o outro.

Então se o outro não diz o que sente e é errado tirar conclusões por conta própria, o que devemos fazer se o outro parece cada vez mais distante, mais estranho, mais absorto no próprio mundo, donde ninguém mais consegue alcançar?

"Mas, como o humano é frágil e perecível, teremos sempre de buscar ao redor de nós pessoas que amaremos e por quem seremos amados: privada de afeição e de simpatia, a vida não tem qualquer alegria." (Cícero)

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