quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Me leve para a Lua

Em algum lugar desse mundo, um jovem sonha com o dia em que aprenderá a voar... Da janela do seu quarto ele observa o mundo lá fora, os carros andandos, as pessoas. Alguns casais aqui e alí, outros grupos de amigos e conhecidos que caminham juntos depois de um dia cansativo de trabalho em direção às suas casas... Ao levantar o olhar ele contempla o pôr do Sol, a luz laranja que vai sumindo num crepúsculo belo e delicado, cedendo lugar ao azul aveludado da noite...

As luzes nas ruas se acendem, bem como as luzes dentro das casas, e nosso pequeno não vê o tempo passar, apenas continua a observar a noite com olhos sonhadores. Algumas risadas são ouvidas de uma casa próxima, uma família deve ter se reunido para comemorar algum acontecimento em suas vidas. Será que estão felizes?

As horas continuam a cair e ele continua a sonhar. As luzes das casas se apagaram e todos foram dormir. Ele mesmo se encontra no escuro, observando atentamente o céu que se abre acima de sua cabeça. Muitas coisas o encantam na noite: a profundidade da escuridão que envolve o mundo, o silêncio tão querido que lhe permite ouvir o som de seu dolorido coração e principalmente, os luzeiros que do alto do céu, impedem que o mundo seja mergulhado nas trevas absolutas. De fato nutre uma paixão pelos astros do céu que o fascina desde muito moço. Não se cansa de passar horas a imaginar os milhares de mundos que podem estar escondidos por entre aquelas incontáveis estrelas.

Quando criança, já gostava de deitar no jardim e olhar o céu estrelado até que seus pais o chamassem para dentro e lhe privassem de seus anseios. O interior de sua casa, ou de qualquer outro lugar fechado, lhe causava pânico, pois só o céu estrelado podia lhe oferecer a liberdade de viajar para universos desconhecidos, sem as limitações de uma caixa de concreto. Observando aquele oceano de estrelas ele era então conduzido a contemplar a rainha daquele espetáculo noturno, nosso pequeno satélite que, nas noites de todo o mundo, reina gloriosamente como o próprio Sol: ele olhava para a Lua como quem reverenciava uma deusa, dada sua beleza estonteante.

Uma antiga história conta que o Sol e a Lua são a manifestação física dos amores impossíveis, pois sendo um apaixonado pelo outro, nunca poderiam ficar juntos. Dessa forma, nosso jovem olhava para a lua e nela via-se a si mesmo pois, ainda que rodeada de estrelas, a lua deveria sentir-se solitária pois nunca estava ao lado do seu Sol. Ele, mesmo levando uma vida "normal" estava rodeado de pessoas, mas sempre longe de sua amada, a sua Lua. Ele então desejava em seu íntimo ir até aquela Rainha de Prata, e fazer-lhe companhia, ser para ela o seu Sol. Mas isso era impossível.

Aqui na terra ele buscava também por sua Lua e suspirava ao se perguntar se naquele exato momento alguém estaria buscando seu Sol também. Por algum motivo esse pensamento divertia-o, e ele sorria docemente sob aquela luz branca. Ele decidiu que gostaria de ficar ainda mais próximo de sua amada, e decidiu subir no telhado para lá contemplar o céu com maior clareza, sem os tetos das casas e os fios da rua o atrapalhando. Como sempre fazia, ao chegar no telhado, ajeitou-se da forma mais confortável possível e voltou a fitá-la. Mas nessa noite algo estava diferente...

A lua parecia maior, mais próxima, e todas as outras estrelas tinham perdido seu brilho. Era como se todos os corpos do céu tivessem lhe emprestado sua luz. Por um momento ele pensou ser a luz daquela noite tão clara quanto a do meio dia. E como num feitiço, ela parecia chamar por ele, atraí-lo para si. 

Uma brisa leve, porém gelada se encontrou com seu rosto e fez seu cabelo ondular delicadamente. A sensação era boa e ele se sentiu feliz por isso. Era como se estivesse sendo acariciado por mãos invisiveis. De repente ele notou que no céu, rapidamente cruzou uma estrela cadente e ele logo fechou os olhos e fez seu pedido, que surgiu do íntimo mais profundo de seu coração. De alguma forma ele sentiu que aquela estrela era na verdade um mensageiro, que levaria até a Lua a mensagem de seu coração. 

A Lua finalmente saberia então do seu amor!

Ele desejou então ardentemente se encontrar com sua Musa de Prata. Como nunca desejara antes. Do seu coração, brotou então uma canção*, que ele cantou cm sua voz fraca, porém decidida: 

Me leve para a lua e
Me deixe brincar entre as estrelas
Me deixe ver como é a primavera
Em Júpiter e Marte
Em outras palavras, segure minha mão
Em outras palavras, amor, me beije...

Como se suas preces em forma de canção tivessem sido ouvidas pelo próprio Deus, que em sua infinita bondade lhe concedera seu desejo, apareceu a sua frente um jovem. O mais belo que ela já havia visto.

De pele clara e cabelos prateados, se erguia a sua frente um menino altivo e com olhos tão brilhantes quanto a luz da lua, que o olhava com um olhar de ternura e afeto. Usava uma calça simples e desbotada, de um azul que um dia já fora tão profundo quanto o da noite, e sua camiseta era branca como a neve, aberta pelos últimos botões, revelando uma faixa de pele forte e igualmente branca. Ele tinha certeza: a Lua ouvira suas preces e lhe enviou seu amado. Sem dizer uma única palavra, eles se compreenderam completamente, e sem dizer uma palavra, o jovem filho da Lua lhe estendeu a mão, ao que ele respondeu prontamente levantando e pondo-se ao seu lado. 

Deram alguns passos em direção ao fim do telhado, e nosso jovem apaixonado hesitou. Como quem diz então "confie em mim", o Príncipe de Prata segurou sua mão firmemente e o conduziu. Não cairam, pelo contrário, começaram a flutuar. 

Num piscar de olhos seu medo passou e ele sentiu aquilo fluir naturalmente de dentro de si. Flutuaram por sobre as casas, saíram da cidade e foram ainda mais além. Em pouco tempo, que ele não soube dizer se foram horas ou minutos, estavam sobrevoando outras cidades, plantações, o oceano. Abaixavam-se aqui e alí para olhar uma ou outra paisagem bela sob a luz do luar e outras vezes, apenas sobrevoavam grande lugares, Engraçado notar que as luzes daquelas cidades, vistas de cima, se pareciam tanto com as estrelas, vistas de baixo... Mas nosso jovem voltou seu olhar mais uma vez para a Lua, e seu amado entendeu seu desejo.

Juntos, com as mãos cada vez mais apertadas, eles foram subindo, em direção a luz da lua que parecia cada vez maior e mais brilhante. Um jovem apaixonado e seu amante misterioso, ambos foram atraídos pela misteriosa beleza da mãe da noite e ali, sob a aquela lua de prata, os dois se amam até hoje ao contemplar a beleza das luzes, as da cidades cá embaixo, e as das estrelas lá em cima. E fazendo companhia para a Lua solitária, o amor vence mais uma vez, mostrando que para ele, nada é impossível, até mesmo viajar até os altos e velar pelos corações dos homens que aqui tentam se amar.

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Obs.; A canção usada nesse texto é um trecho da tradução de "Fly Me To The Moon" de Frank Sinatra.

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