domingo, 16 de setembro de 2018

Névoa de Sangue - Pt. 1


A comitiva chegou silenciosamente, mas nem por isso chamou menos atenção do que se tivessem trago consigo dançarinas e trombetas. Os primeiros cavaleiros carregavam grandes bandeiras, com um brasão simples pintado nelas, bem como os últimos da comitiva. Soldados fortemente armados com lanças e espadas formavam um grande cortejo que culminava numa carruagem simples, mas que por estra ali já obrigava nos transeuntes que ali estavam um certo respeito.

O jovem observava atentamente, de uma torre no hotel que ficava de frente para o que fora alugado para a comitiva daquele importante governante. Ficaria ali por uma noite, onde participaria de uma reunião com homens de negócios e retornaria novamente para sua residência, um pouco distante dali, do dia seguinte. 

Um. Dois. Oito. Doze. A segurança era rígida, e soldados cobriam cada metro do terreno do hotel que, além do dono e de sua esposa, contava apenas com alguns poucos funcionários de confiança que não foram dispensados naquele dia, para cuidar daquele cliente tão poderoso.

Ele observou atentamente a formação dos homens, e percebeu que mais de uma equipe de segurança havia sido contratada. Certamente alguns ninjas inclusos e disfarçados entre os soldados. Ao cair da tarde saiu de seu esconderijo e avançou rapidamente pelos pontos cegos que conseguira identificar. A cada hora os soldados trocavam de lugar e nessa hora alguns minutos entre um ajuste de posição e de armadura davam a ele a abertura necessária para silenciosamente conseguir entrar e esperar no depósito de alimentos, que ficava no fundo do estabelecimento.

Aguardou pacientemente até que anoitecesse, atrás de uma alta pilha de sacos de arroz. Observando pelas frestas da porta de madeira cruzada que dava para o pátio dos fundos, onde os funcionários certamente deveria ficar nos dias mais quentes. Sabia que durante a noite o número de serviçais deveria ser ainda menor.

Uma moça pequena avançou para pegar água no poço que havia ali, e enquanto o balde se enchia de água na pequena torneira que havia ao lado do poço, ela foi em direção ao depósito. Era a hora. Rapidamente ele avançou, silenciando-a com um golpe certeiro com a palma da mão em seu flano, fazendo a cair debilmente como uma boneca de trapos em cima dos sacos de arroz, que abafaram a queda. Ele a amarrou e amordaçou depois de lhe tirar o uniforme, um quimono rosa cheio de flores coloridas, que serviu justamente. Sua aparência feminina, delicada e esguia, seria ideal para enganar os soldados e se passar como funcionária do hotel. 

Esperou pacientemente até que sua presença lhe fosse solicitada, fugindo dos olhares dos outros funcionários, que saberiam que ele não fazia parte do número dos responsáveis pelo estabelecimento, mas sem se importar com os soldados, que não o conheciam de qualquer maneira.

O chá da noite fora servido numa porcelana fina, mas os soldados não permitiram que ele se aproximasse do casal que ali se hospedava. Deixou a bandeja no chão, próximo a porta e se afastou, para que o responsável se encarregasse de entregá-la ao seu senhor. Quando se ajoelhou, uma parte de sua perna se tornou visível pela abertura do quimono, o que despertou o olhar de dois, dos quatro, soldados que ali estavam. Era suficiente. Quatro soldados na antessala que dava para o quarto dos hóspedes ilustres e mais seis na antessala seguinte.

Mais do que rapidamente ele lançou uma pequena pedra na lâmpada acima de suas cabeças e num movimento rápido sacou a wakizashi escondida nas dobras de suas vestes, avançando em direção ao quarto.

Lançando-se no ar e rodopiando derrubou os dois soldados que estavam mais próximos a porta, e com uma cambalhota entrou no quarto, esperando apenas alguns segundos para acostumar-se com o quarto e para identificar seu alvo. Com apenas um salto ele chegou a cama, onde seu alvo assustado o encarava. Estava nu sobre a cama, e tentava alcançar uma faca, provavelmente escondida embaixo das almofadas. Tolo.

Antes que o governante percebesse o seu assassino estava sobre ele, com um joelho apoiado sobre seu peito e a espada curta na garganta.

- Tenho um recado para você, maldito - sibilou como uma serpente - sua família nunca mais vai interferir em nossos negócios.

A essa altura os soldados desbaratados já haviam entrado no quarto. Ele cortou a garganta do homem rapidamente, e logo se lançou para trás, girando num salto por sobre o corpo que jorrava sangue quente. Encarou os soldados que lotavam o cômodo e sabia que o número deles ali o impediria de escapar.

- Avancem! - Uma voz jovem e firme gritou, e o assassino sabia ser de um dos soldados cujo olhar brilhara ao vê-lo ajoelhado segundos antes.

Ele derrubou dois dos homens lançando-se no ar novamente com a fluidez de uma pluma, e partiu ao meio a lança de um terceiro. Mas só teve tempo de dar um salto para trás quando uma lança penetrou fundo em sua coxa, enquanto outra entrava eu seu ombro logo em seguida.

Urrando de dor ele se ajoelhou, a perna ensanguentada tremendo, e fitou com ódio os soldados que o olhavam assustados. O homem responsável por dar as ordens saíra do quarto, gritando para que mais soldados fortalecessem o perímetro e que fossem verificar se seu senhor estava bem, no outro quarto.

Era uma última proteção, ele matara provavelmente um soldado, enquanto seu senhor estava em outro quarto, provavelmente não tão bem guardado, para evitar suspeitas.

A confusão dos momentos seguintes não distraiu o pequeno assassino, disfarçado de empregada, de sua dor lancinante na perna e no ombro. Decidiram que a comitiva partiria imediatamente, temendo novos ataques. Enfaixaram toscamente suas feridas enquanto o amarraram, pois seria levado para interrogatório na mansão do senhor, para descobrirem quem fora o mandante daquele atentado.

Disputas de poder são comuns, principalmente entre famílias que possuem grandes ambições e pouco, ou nenhum, escrúpulo. Assassinatos são comuns. Contratar mercenários e ninjas é tão normal quanto vender e comprar para aquela gente. Os assassinos não são mais do que meras ferramentas, que emprestam seu corpo e suas técnicas letais em troca de um soldo gordo. Essa era a realidade, o pequeno ninja pensava enquanto era lançado numa carroceria de ferro que lhe seria sua prisão até que chegassem na mansão.

Fora lançado no chão metálico com violência, fazendo reabrir os ferimentos causados pela lança. O chefe da guarda, que ele reconhecera pela voz, mandou que ficassem atentos a qualquer movimento. Ele notou um olhar de deleite no homem, antes que lhe fechassem as portas da carroceria a sua frente.

Infiltração concluída com sucesso!

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