sexta-feira, 5 de julho de 2024

E o mais que faço

Como essas pessoas conseguem falar tanto? Eu já nem tento mais disfarçar a minha cara de absoluto desinteresse, por todos e tudo que eles têm a dizer. São todos um porre. E não digo isso com aquela imitação patética dos cacoetes mentais do livro que acabei de ler, não, mas como alguém que já ouviu tanto essas conversas e sabe que elas apenas escondem um vazio interminável, consciências toscas que são incapazes de se lembrar do que quer que seja, ao darem as costas a quem as ouviu. Por isso a minha cara de completo tédio, porque isso é o máximo que eu consigo. 

Peguei por alto quando falaram sobre depressão e pedidos de ajuda, de novo relembrando o acontecido de meses atrás. Eles não sabem de nada, idiotas. E ainda dizem que não há sinais, mas houveram sinais, e todos ignoraram. É mais fácil colocar a culpa em quem não aguentou mais, mas não percebem que não aguentou justamente porque o peso que colocaram foi grande demais. Essa vida é muitas vezes pesada demais. 

Há dias que levantar da cama e ver o maldito sol brilhar é pesado demais. Mas ninguém se importa, acham que são citações aleatórias ou um pessimismo fechado em si mesmo. Não entendem, por exemplo, que as citações são apenas uma catarse, uma condensação literária de uma experiência real que tive e que encontrei similares em espíritos de outras épocas  lugares. O fato de encontrar neles um pouco de compreensão, a mesma que os meus me negaram, é uma prova de que o outro me vê todos os dias sem nunca me enxergar. 

Por isso eu continuo em silêncio. Quieto. Com um olhar vazio e idiota que nada mais é que a exteriorização desse vazio e da opinião que tenho dos outros, grandes idiotas, e de mim mesmo, um idiota consciente, mas nem por isso menos idiota. 

Em algum momento de hoje ma falaram sobre esperança, e disseram isso também alguns dias atrás, e eu então assenti, quieto, mas por dentro consciente de que, hoje, sou completamente cheio de pura desesperança. Também não digo isso de um jeito a querer parecer mais realista ou mais pessimista, esse é o ponto em que eu queria chegar: todos querem ser ou parecer alguma coisa, conquistar alguma coisa. Eu já desisti de tentar, o que quer que seja. Me falam em namorados ou amigos e eu só sorrio de um jeito demente, me falam sobre cursos, trabalhos, e eu só consigo pensar em coisas mais imediatas, como dormir ou ver mais um episódio. A cada dia minha vontade é movida por esses ideais próximos: dormir ou ver mais um episódio, e o mais que faço não vale nada!

Não contemplo longe nem a miragem, amo o que é fácil. Enquanto as pessoas falam sobre ferramentas e coragem. Sobre planos e compras. Eu gastei todo meu dinheiro, que não era muito depois de ter pago os empréstimos, em chás e alguns cosméticos, não sobrou muito para os livros, ou as roupas, ou os planos. E eu sei que se buscar eu até poderia encontrar a saída para esse ou aquele problema, para essa ou aquela visão, mas isso implicaria ainda uma busca sutil por esperança, e eu já não tenho mais condições de buscar nada. 

"O sofrimento e a dor são sempre obrigatórios para uma consciência ampla e um coração profundo. Os homens verdadeiramente grandes, a meu ver, devem experimentar uma grande tristeza no mundo." (Fiódor Dostoiévski)

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