terça-feira, 21 de agosto de 2018

Uma noite de amor e jazz

A noite é luminosa, mas não pelas estrelas que brilham timidamente em comparação com as luzes fortes e coloridas dos letreiros e dos prédios. As miríades de pontinhos brilhantes desde as janelas dos arranha-céus até as casas distantes fazem da cidade um mar de pérolas amareladas. 

Pela janela do apartamento, grande e de um vidro translúcido que muito bem podia pensar-se que não havia nada ali, as luzes dão um show a parte. O jazz toca baixinho no player, e o piano e as vozes poderosas preenchem o ambiente de uma aura romântica. A brisa fria entra lenta e delicadamente, fazendo balançar as cortinas brancas. 

Numa cama enorme duas almas se encontram. O ritmo da música dita os movimentos das mãos e pernas que aos poucos se encontram e se encaixam. Os lábios macios se tocam, e leves mordidas os deixam avermelhados. A respiração alta, ávida, só é audível aqueles dois, que são iluminados indiretamente pelas luzes que entram pela janela, deixando o lugar com uma cor cinza. 

O menor observa por alguns instantes o corpo do mais alto. Seu peito musculoso se destaca na regata branca que ela usa por baixo da camisa preta, agora jogada ao chão. A calça cáqui, já aberta. Seus braços fortes e firmes se parecem com mármore, ao passo que as veias saltadas dão aquela estátua divina ares de humanidade. O cabelo, já um pouco bagunçado pelas mãos rápidas e inseguras do pequeno, e o olhar, desejoso de amor, fazem daquela cena um perfeito canvas, pintado talvez por Dionísio, em um de seus delírios de prazer.

O outro garoto se apoia com os cotovelos na cama, e seus braços tremem com o próprio peso, enquanto seus lábios e suas pernas tremem numa mescla de desejo e medo. Seu olhar brilha tanto que ele mais parece contemplar um anjo, e não outro homem. 

A música que havia diminuído lentamente recomeça, num ritmo levemente mais acelerado, e ele retomam o beijo, ainda mais apaixonado do que antes. O hálito doce do mais velho se encontra com o perfume almiscarado da barba do mais novo que, embora mais alto e mais forte, se mostra nervoso com aquele desejo recém descoberto. 

É um momento novo. Ele, o rapaz forte, nunca se imaginara naquela situação, nunca se imaginara desejando outro homem, mas ali, naquele momento, nada mais em sua cabeça fazia sentido, senão que ele queria possuir aquele que a sua frente sorria, implorando pela seu amor. O perfume doce, feminino, do rapaz menor o fez enlouquecer. Sua visão se turvara, como se tivesse possuído por um dos deuses da vodka, e ele não tinha certeza de mais nada além de uma súbita consciência de que cada centímetro de seu corpo também o desejava. 

Ele então se curvou, e seus lábios se tocaram mais uma vez. Ele beijou seu amado com tudo o que tinha, todo seu carinho, todo seu desejo estavam impressos ali, bem como todo seu medo que se dissolvera no ar como o hálito da respiração ofegante que logo desaparecia. Ele beijou seu rosto, e desceu lentamente pela linha do pescoço, provocando no outro suspiros e arrepios, e quando chegou um pouco abaixo, foi surpreendido. 

O outro que até então se mostrava passivo, extasiado pelo momento, reagiu com uma força estranha, quase sobrenatural, que o puxou com violência para junto de si, encaixando seus corpos com perfeição num novo beijo, mais violento que os outros, e ainda mais repleto de desejo.

Separaram-se por alguns breves instantes, suficientes apenas para que as roupas fossem lançadas ao chão a esmo. Não se olharam nem por um segundo, pois estavam decididos a explorarem cada parte de seus corpos com todos os sentidos.

As mãos firmes do mais novo seguravam com força, e deslizavam pelo corpo do outro como se temesse que algo no mundo pudesse separá-los. Enquanto isso os lábios do mais velho, e menor, exploravam cada linha, cada canto, do corpo forte do seu amado. Sentiu os músculos se enrijecerem com seu hálito, e sorriu, enquanto mordia aqui e ali, fazendo o outro contorcer-se de prazer. Algumas gotinhas de suor começavam a escorrer do pescoço daquele que era mais novo, e menos experiente, mas que sabia exatamente o que deveria fazer.

Tomando novamente o controle da situação ele trouxe o outro para perto de si, e certo de que aquele era o momento para que se unissem mais intimamente. Quanto tempo se passou desde que se conheceram, quanta coisa viveram juntos, quantas dificuldades. Se aproximaram numa amizade inesperada, calcada na generosa companhia nos momentos de aflição. Se afastaram pelos ciúmes quando um deles se apaixonou por outra pessoa. E se reaproximaram porque nem mesmo o destino pode lutar contra um amor verdadeiro para sempre. 

E o seu amor se consumou num gesto de entrega total. Corpos que se comunicaram sem dizer uma só palavra, entre suspiros e gemidos, entre beijos e mordidas, entre abraços e carícias que duraram a noite toda.

As vozes na musica se calaram. Apenas o baixo e o sax ficaram, baixinhos, enquanto os dois se abraçavam, olhando para a luz cinza que entrava pela janela. As mãos ainda trêmulas, as pernas sem forças, os lábios vermelhos.

Com um sorriso doce eles aos poucos se deixaram envolver pelo sono que vinha, juntamente com o sol, que já se anunciava no horizonte, tímido, pois a lua lhe contara tudo o que ali se passara naquela noite, mas orgulhoso de que agora iria com sua luz tocar o corpo daqueles dois amantes. 

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