quarta-feira, 10 de janeiro de 2024

A brisa, nosso último abraço e um café

"O gesto do abraço apaixonado parece preencher, num momento, para o sujeito, o sonho da união total com o ser amado." (Roland Barthes)

Fiquei próximo da porta grande que dá direto para a sacada. Nesses dias de calor a brisa que vem da Baía da Babitonga entra por ela e faz desse lugar o mais fresco da casa e desse bairro um dos mais frescos da cidade. O calor do verão é complicado de se enfrentar, só é possível ficando quieto debaixo de um aparelho de ar-condicionado, no mais, é insuportável e se começa a transpirar em poucos minutos. 

Encontrei então o que é um lugar bem agradável para ficar. Com uma música baixinha, tenho selecionado algumas listas com faixas mais lentas, facilmente encontradas com os nomes chill and late night. São geralmente faixas mais trnaquilas ou sensuais e, às vezes, melancólicas apesar das batidas modernas do kpop e combinam, tanto com meu intuito de relaxar quanto com a minha personalidade.

E claro que, tomando um pouco de licor, com um livro no colo e ouvindo essas músicas, a minha imaginação se deixou vagar um pouquinho. Pensei então em você, talvez em silêncio comigo, cada um com um livro no colo, mas um de nós lê com a cabeça encostada no outro. 

Como é a decoração da nossa casa? Eu prefiro a simplicidade de móveis em estilo industrial, daqueles que combinam madeira e estruturas visíveis de ferro, enquanto você gosta de móveis antigos, daqueles com entalhes e madeiras especiais. E assim temos uma mesa bem pesada ao lado de uma prateleira cheia de livros, entre clássicos da literatura, filosofia, até manuais de química orgânica. O sol entra forte, como hoje, assim como uma brisa leve, combinada com o perfume de alguns óleos que eu ainda gosto de usar. 

Me recordo da história de como cada móvel foi parar ali. Aqueles mais antigos, pesados e caros, que entraram com a ajuda de algumas pessoas que precisamos chamar porque não conseguimos carregar sozinhos, e os outros que precisamos da ajuda de outras pessoas porque também não conseguimos montar sozinhos. Mas os livros nós os organizamos todos, por interesses de nossos estudos, alguns se mesclando em interesses em comum aqui e ali.

E as cerâmicas? Compramos aquele conjunto clássico que parece ter saído de um filme sobre a realeza britânica, mas também compramos aquele jogo que foi feito por uma ceramista aqui da região e que é rústico e parece mais um erro do que um produto final... 

E claro que, nesse breve devaneio, que veio e se foi tão breve quanto a brisa fresca que entrou, beijou meu rosto e sumiu, eu me recordei daquele nosso último abraço, em dia tão quente quanto esse, em que você escondeu suas lágrimas e eu não queria ter me soltado dos seus braços, sendo que, se pudesse, ainda estaria lá, de pé, próximo do seu coração.

Gosto quando conversamos assim, brincando e sorrindo. Sei como você está cansado de tudo, afinal foi um ano difícil, e quando você sorri posso esquecer um pouquinho de tudo o mais, espero que seja assim pra você também. Fui dormir sorridente, e hoje novamente ficamos assim. Mesmo apesar da distância sinto que isso nos aproxima um pouquinho. Será que você consegue sentir daí, o meu coração contigo? 

E então eu penso, e se nos víssemos de novo, com a saudades que temos e que confessamos? Como seria? Será que um abraço apertado poderia bastar por todos esses meses que nos separaram? Ou poderia, ao menos por breve momento, me encostar em seu peito e repousar desse tão tortuoso suplício?

Longe do bater aproximado de nossos corações estão as palavras que dizemos e que nos confundem... Como se nunca fôssemos nos entender, mesmo que falemos com sinceridade. Mas nem tudo é dito, e muito precisa ser interpretado. De mim apenas uma resolução: nossa proximidade tem limites bem definidos e, ao mesmo tempo. parecem estar envoltos em véu de obscuridade. 

E estamos longe, muito longe, bem mais do que indicam as estradas que separam nossos estados e, não há possibilidade de abraço. Bom, é o que temos: saudades. Só o que posso fazer é secar as lágrimas, levantar e passar um café.

"Eu gostei de você desde quando te conheci, já te falei isso, quando estou tomando café, fico pensando que deveria ser obrigatório que você estivesse perto, que você tomasse café junto comigo. Antigamente, eu lembrava de você por outras ocasiões, mas hoje não, eu olho para o café quente, exalando fumaça, e lembro do seu abraço quente e apertado. Acho engraçado, até sorrio só de imaginar, como o amor se ressignifica e se esconde nessas coisas mais simples, o ato de fazer um café, sentar para tomá-lo e sentir sua falta." (Kaio Bruno Dias)

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