quarta-feira, 22 de maio de 2024

Meditações Noturnas

"Moonlight Night. Meditation", 1876 - Arkhip Kuindzhi

"Das pessoas, eu esperava o bem divino e o medonho diabólico; da vida, esperava a beleza encantadora e o abominável, e dominava-me uma ânsia por tudo isto, um profundo e angustioso anseio pela realidade distante, pela vivência, qualquer que fosse o tipo, pela felicidade inebriantemente magnífica e pelo sofrimento indizível, insuspeitadamente terrível." (Thomas Mann)

Chegaríamos em casa num fim de tarde, no inverno abriríamos um vinho enquanto cozinhamos algo juntos e conversamos sobre o dia, talvez assistiríamos a um filme ou ficaríamos deitados no escuro, a música baixinha no embalando até o sono. No verão talvez ficássemos mais animados na sacada, com uma cerveja gelada, pediríamos comida e dormiríamos no ar-condicionado. 

Sei que não é um pensamento ambicioso, francamente não os tenho mais, mas, em se tratando de mim, este é o cenário mais utópico possível.

Os grandes sistemas de domínio global já terão colocado seus tentáculos ao redor de todas as nossas consciências. As grandes religiões não mais servirão de contato com o divino transcendente senão que serão como antessalas e mecanismos de dominação de grande potentados financeiros. Todo resquício de conhecimento profundo e verdadeiro será substituído por um simulacro de espiritualidade raso. A mentalidade das pessoas estará mergulhada numa confusão sem precedentes que fará surgir alguns espíritos altivos, uma multidão de santos a despertar desse sono profundo, provocando por gigantes cujos nomes desconhecemos. 

Mas eu já não estarei aqui para ver essa multidão de santos, farei o meu pequeno trabalho: rezarei pela salvação daqueles que amo. Se puder ajudar um deles que seja, já estarei bastante grato. Talvez me restem apenas esses dois pensamentos, esse quase evanescente, de uma realidade impossível, onde abriríamos um vinho e sorriríamos juntos, e esse, de um futuro difícil, que há de provar no fogo os homens de verdadeira boa vontade. 

"A cada um a sua inclinação: a cada um também o seu objetivo, sua ambição, se quiserem, seu gosto mais secreto e seu mais claro ideal. O meu estava contido na palavra beleza, tão difícil de definir, apesar de todas as evidências dos sentidos e dos olhos." (Marguerite Yourcenar)

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