Por algum ângulo talvez eu tenha dormido demais, ou pelo menos, foi isso que me disseram em casa. Dormi ontem por volta de duas da tarde, e acordei só hoje, perto das nove da manhã. Não acho que foi tanto assim. Mas o que eu faria acordado? Graças a crise de alergia eu não conseguiria ler ou ouvir aulas, de modo que nem mesmo conseguiria assistir, já que a televisão estragou e não gosto de ver pelo notebook. Sem amigos para ligar e sem dinheiro para sair, o que mais eu poderia fazer?
Foi então a decisão simples de um homem que se viu sozinho. O velho Buck teria enchido a cara de cerveja ou whisky, e eu até tenho algumas garrafas de vinho guardadas, mas tampouco tinha disposição para abri-las. Enfim, minha opção foi pelo sono profundo, o que sempre tomo como uma espécie de antessala da morte, um prenúncio do fim. Enquanto para todos os outros a morte é um tabu e o suicídio é algo de revoltante, para mim é o que há de mais próximo de uma esperança: é a possibilidade de ver findar essa existência miserável, rodeado de pessoas miseráveis e eu mesmo sendo miserável, escrevendo infindáveis cartas de amor ao modo de Fernando Pessoa, isto é, ridículas.
E as pessoas não cansam de mostrar eu estou certo ao pensar isso. Uns que só se preocupam com os títulos e receber bem as pessoas, patéticos, e outros que se preocupam com tudo o mais, onde tudo é interessante, mas que não percebem nada de realmente importante ou valioso. Não há como olhar para essa humanidade senão com desânimo e nojo. Como pôde Cristo sentir compaixão de nós quando cada ação humana implora pela destruição eterna?
Ele não se cansa de me mostrar o quanto somos diferentes. Enquanto penso nele, tudo o mais ocupa sua mente, tudo menos eu. Voltando então a minha esperança, assim como dormir um dia inteiro não faz com ninguém sinta minha falta, a ausência prolongada seria logo esquecida, substituída, assim como já hoje não ocupo a mente de ninguém. Até mesmo essas palavras se veriam subjugadas as areias do tempo, não veriam a luz jamais pelas páginas de um livro lido ao anoitecer, apenas se veriam gravadas nas paredes do Ser, onde ninguém jamais lê.
Ignora então o óbvio que pulula aos seus olhos. Explora as muitas possibilidades de fracassar e ser medíocre, a essas chances o homem nunca decepciona. Ignora o amor, ignora o saber, ignora a santidade, ignora a beleza, prenda-se a tudo que é passageiro, idiota, fugaz, prenda-se aos sonhos mais toscos enquanto ignora os campos elísios que se abrem diante de ti. Ignora a verdade que luta para não ver jamais.
Melhor mesmo é dormir, sem ter hora para acordar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário