domingo, 23 de junho de 2024

Doçura

Experimentando a mais absoluta solidão. Quantas vezes eu já disse isso? Completamente exausto ao sair de uma reunião onde ninguém entendeu o que eu disse. E minha família são estranhos que vivem na mesma casa que eu, também não entendem o que digo. Meus amigos e conhecidos do trabalho, todos eles são pessoas com que troco palavras, mas ninguém entende o que digo. E eu não os entendo. Somos então universos inteiros, distantes, singularidades em ruínas.  

"Não, não é cansaço... É uma quantidade de desilusão que se me entranha na espécie de pensar." (Fernando Pessoa)

Querem o amor que idealizam, também já o quis. 

Querem as festas, os arroubos espirituais. 

Querem o sucesso, querem os amigos. 

Querem ter família, uma casinha branca de varanda, um quintal e uma janela pra ver o sol nascer. 

Eu não consigo querer mais nada disso. Eu só queria não ter que ver as pessoas correndo loucamente atrás disso como se algo disso tivesse algum valor. 

Os amores traem, acabam, ou preferem morrer a amar de verdade. 

As festas terminam e resta apenas a ressaca, 

os arroubos espirituais cessam e não conseguem suportar a noite escura. 

O sucesso passa, 

os amigos morrem e, passados alguns poucos meses, ninguém mais se lembra de verdade. 

A família briga, a casa se desfaz e a varanda, onde um dia conversaram ao cair da tarde, vê-se a mercê dos cupins e de um tempo implacável que logo a transforma em ruínas. 

Tudo isso passa. O destino do homem que caminha nessa terra miserável é a ruína. Por isso só tem valor aquilo que não passa. Por isso só aquilo que permanece, eternamente, é que deveria constituir ao homem objeto de desejo. 

Dessas coisas o amor poderia ser eterna, mas os homens não querem amar. Preferem morrer. E eu também prefiro. Prefiro a morte, prefiro o não ser, prefiro voltar ao nada, a viver sem o amor eterno. São Filipe Néri cantou que preferia o paraíso, mas já o vejo tão distante e tão pouco merecedor dele que não posso desejar mais isso. Não sem o amor. Então, se não posso amar...

... Eu também prefiro a morte. 

Que outra doçura pode haver ao cabo da existência de alguém que já não tem nada a querer ou desejar?

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