sexta-feira, 21 de outubro de 2016

Há dias assim...

Há dias em que sinceramente seria bem melhor se nem sequer tivéssemos saído da cama, desligado a internet e passado as próximas 12 horas ouvindo boa musica ou em completo silêncio, simplesmente meditando as desgraças da vida e pensando, no quanto somos pequenos e frágeis. 

Mas não, resolvemos levantar, encarar de frente o mundo lá fora. E o que encontramos logo ao sair da porta do quarto? Um gigantesco exército que acabou de dizimar toda sua família, e que apenas o esperava para dar fim a sua vida da forma mais lenta e dolorosa possível. 

Há dias em que acordamos mal, sem vontade de fazer nada, querendo cancelar todos os compromissos firmados para as próximas horas. Em dias assim, caminhar, conversar, tudo isso exige um esforço imenso, e é necessário uma força sobre-humana para conseguir dar um passo sequer. O corpo reflete então o caos em que se encontra a mente. 

Caos

Aquele velho conhecido dos loucos enamorados surge então com sua força devastadora: um tsunami de pensamentos alucinados que nos lançam impedosamente num oceano de águas frias e impiedosas. Nesse oceano damos voltas e voltas, tentanto não nos afogar, lutando para não morrer. Mas qual o significado dessa luta? 

Ora, lutamos para não morrer, mas a vida tem se mostrado tão difícil que morrer soa como uma doce solução. Não tenho pensado em me matar, que fique bem claro, a questão aqui é outra. A pergunta correta é "Qual o objetivo de toda essa luta pela sobrevivênvia? Estamos lutando para sofrer ainda mais?" 

Sofrer

O homem teme a dor e o sofrimento. No entanto, não há como evoluir em sabedoria sem passar por ambos. Diria que a dor e o sofrimento são os grandes mestres dessa pequena criança sedenta por aprendizado a que chamamos de sabedoria, e tanto mais eles lhe ensinam sobre a vida, mais coisas há para ensinar, e portanto, mais dor e sofrimento a suportar. Entre uma lição e outra, cabe a nós os breves divertimentos que nos provocam os sonhos, os devaneios. Aqueles doces momentos em que a mente se liberta das amarras do mundo e voa livremente a imaginar o que quer que seja. E assim ela [a mente] se entrega a esses sonhos...

Sonhos

Sonhos das lembranças mais românticas, dos momentos mais felizes que nunca aconteceram, sonhos... Sonhos com aquela pessoa... Sim, aquela pessoa! Sonhos com aquela em quem pensamos quando vamos dormir, e sonhos com aquela de quem nos lembramos ao acordar. Sonhos. Mas o sonhos não são a realidade.

Realidade

A realidade pode ser tão bela quanto a dos sonhos? Sim. Sem sombra de dúvidas. No entanto, o conceito de beleza para aquele que controla a realidade é diferente do nosso. Logo, a beleza da realidade é ofuscada pelo brilho da beleza dos sonhos. Mas note que eu disse pelo brilho, e não pela beleza do sonhos. Pois justamente por ser real, a única beleza realmente verdadeira é a da realidade. 

Mas a realidade é complexa demais para se compreender, e por isso naturalmente a evitamos, e preferimos viver no mundo onde tudo é mais fácil, e no entanto, onde nada é real. Aceitar essa verdade é essencial para o crescimento. Quem consegue aceitar isso vive verdadeiramente, quem não o faz, deixa de existir para viver uma realidade imaginária que nunca se tornará real. Volta a inexistência.

Inexistência

O meu grande desejo. Um dos meu anseios mais profundos. Voltar aquele estado primitivo onde sequer havia sido concebido ainda. Dessa forma não precisaria magoar tantos quanto me cercam e nem sequer me machucar também. Seria melhor para todos. Que não precisassem se preocupar com alguém tão descartável, tão trivial quanto eu. Ora, não sou o melhor em nada que faço, qualquer um poderia me subtituir em todas minhas funções. Como filho, professor, cerimoniário, enfim, como pessoa, qualquer um poderia ser melhor do que eu.

E no entanto eu ainda sou obrigado a existir. Não a viver, pois não me atrevo a chamar esse período absorto em pensamentos como vida, apenas existência, e uma existência sem sentido. 

Sentido

Sentido é aquilo que nos guia. O motivo final por detras de todas as nossas ações. Os fins que justificam os meios, parafraseando Maquiável. Mas eu perdi meu sentido, e agora perco também os meus sentidos. Perdi minha estrela guia, e agora, sem mapa nem bússola, me encontro perdido em meio a esse terrível deserto de pensamentos, sendo engolido pela areia das dunas que caem sobre mim. 

Que caem sobre mim

Não suporto um julgo pesado. Não carrego mais responsabilidades que qualquer outra pessoa, pelo contrário, vida é relativamente fácil e simples, e no entanto eu ainda estou em sofrimento. Reconheço que meus problemas não são nada comparados aquelas pobres almas que padecem nos leitos dos hospitais, ou esquecidas dos amigos e parentes nos asilos até o dia de suas mortes, onde por um instante todos se lembram deles, para no dia seguinte voltarem a cair no esquecimento. Como se nunca tivessem existido.

Essas injustiças me incomodam, e ao menos uma vez por dia eu penso em como aqueles que abandonaram tudo em função dos mais pobres e necessitados devem ser mais felizes. Esses sim devem conhecer o que é o sofrimento de verdade e compreender o que de fato é a dor. Não essa minha dor falsa, infantil.

Shakespeare disse que todos conseguem compreender uma dor, menos quem a sente. E penso que isso seja uma afirmativa completamente verdadeira. Assim como os conceitos de belo e feio variam de pessoa para pessoa, o conceito de dor também. Portanto, por mais que seja uma dor tola, infentil, essa É A MINHA DOR, essa é a dor que AFLINGE A MINHA ALMA, e portanto, somente eu que a sinto sei o quanto dói, ainda que aos olhos dos outros ela não passe de um drama exagerado. 

Mas não é possível fugir da dor. Ela aflinge o quanto lhe aprouve aflingir, e cabe a nós apenas aceitar, já que não há como fugir. 

Suportar, por mais que doa. Em alguns momentos se afastar do mundo, suportá-la sozinho num quarto escuro, em posição fetal ao som de musicas que nos ajudem na compreensão da dor. Em outros, dividir também. 

Há dias assim.

Há dias em que queremos ficar a sós. Sem interferência de ninguém, sem contato, e penso que isso seja coisa boa. Momentos de reflexão interior enriquecem a visão que temos de nós mesmos e do mundo.

Há dias quem estamos bem, há dias em que não estamos tão bem assim, e há dias em que só queremos deixar de existir, há dias em que só queremos sumir. Há dias em que as borboletas dançam alegremente no jardim, e há dias em que só existe em nós a lembraça das cores que antes voavam naquele jardim. Há dias assim...

Ainda é cedo, amor
Mal começaste a conhecer a vida
Já anuncias a hora de partida
Sem saber mesmo o rumo que irás tomar

Preste atenção, querida
Embora eu saiba que estás resolvida
Em cada esquina cai um pouco a tua vida
Em pouco tempo não serás mais o que és

Ouça-me bem, amor
Preste atenção, o mundo é um moinho
Vai triturar teus sonhos, tão mesquinhos
Vai reduzir as ilusões a pó

Preste atenção, querida
De cada amor tu herdarás só o cinismo
Quando notares estás à beira do abismo
Abismo que cavaste com os teus pés

(A Vida é um moinho - Cartola)

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