sábado, 17 de dezembro de 2016

Nova Vida

As vidas nos reservam surpresas tão grandiosas que sequer cogitar a ideia de falar sobre elas me causa vergonha. Minha pequenez espiritual se reflete numa pobreza estilística que, penso eu, desonram as experiências em sua totalidade. Mas como escritor, penso que deixar de relatar tal fato seja como lançar ao fogo uma bela carta de amor, sem que sua mensagem tenha sido entendida pelo coração do amado, depois de tantas ânsias inflamadas da amada.

Não é desconhecido de ninguém que não sou o maior entusiasta de participar de encontros e retiros. Nada especificamente contra essas iniciativas, mas é que, desde o início de minha caminhada cheia de tropeços na Igreja de Deus, eu sempre estive a frente, ou auxiliando a frente. Nunca estive do outro lado, sentado, ouvindo, meditando, aprendendo. 

Como a maior parte de minha parca "conversão" foi de certa forma autodidata e utilizando de um método quase cartesiano, por assim dizer, os que me viam querendo ajudar de alguma forma me lançaram logo sempre à frente das organizações e coordenações. De certa forma, eu pulei a parte do aprendizado, daquele que se inicia do básico, e aos poucos vai evoluindo. Mas o meu crescimento era puramente intelectual, ou seja, eu estava conhecendo mais a igreja em si, suas hierarquias, organizações, a doutrina em si, mas eu sempre senti que faltava algo mais, algo que ligasse tudo isso a minha vida, que desse a tudo isso um sentido maior, que de fato mudasse minha forma de ver e ser igreja. 

Esse vazio, era uma compreensão real do Amor de Deus. Quando me refiro a Amor, ou quando digo "Deus é amor", geralmente medimos esse conceito através da imagem que temos do amor. Ou seja: um amor imperfeito, o amor dos homens. Por isso eu tinha um pouco de resistência a essas expressões. Mas eu estava errado, completamente errado.

O Amor de Deus nada tem que se pareça com o amor dos homens. O amor dele é perfeito, pois ele é perfeito, e seu amor não poderia ser diferente. E esse amor, sendo perfeito, lança dessa perfeição sobre aquelas coisas que ainda carecem dela. No meu caso, todo meu conhecimento, que de nada valia se eu não conseguia sentir realmente o que ensinava. 

Mas esse amor, já existia desde o início dos tempos, quando Deus criou o mundo e o "seu Espírito pairava sobre as águas" (Gn 1, 2) pois Deus tinha grandes planos para nós, e por isso criou um mundo perfeito, onde poderíamos viver esse plano glorioso.

Mas Adão, e com ele todo gênero humano, por sua cobiça, acabaram por deturparem os planos de Deus, motivado por seu egoísmo e sua ganância. Mas na espera de encontrarem no mundo a realização que estava em Deus, buscaram no pecado, que os conduziu, ou melhor, que conduziu a todos nós para a morte, como fez Absalão, que em sua cobiça pela glória de seu pai, o Rei Davi, cometeu crimes terríveis e acabou morto, preso nos galhos secos do pecado que hoje aprisionam toda a humanidade.

Esse galhos, são o pecado, são as correntes que nos impedem de ir além, e que nos mantém sempre presos no mesmo lugar, cada dia mais enlameados pela imundície do pecado, cada dia com a feição mais monstruosa, ainda que disfarçada pela maquiagem dos sepulcros caiados, que encobrem um pecado com uma máscara de virtude.

Mas a libertação é possível, e nos dada de bom grado. Pois mesmo sendo pecadores, "Onde abundou o pecado, superabundou a graça" (Rm 5, 20)

Deus enviou seu filho amado, para morrer no nosso lugar. Na cruz, ele não só pagou por nossos pecados, mas recebeu todos eles em seu frágil corpo humano, e como vítima perfeita e pura, se tornou um sacrifício agradável a Deus, que substituiu os antigos sacrifícios imperfeitos pelo cordeiro imaculado, pois "aquele que não conheceu o pecado, Deus o fez pecado por nós, para que nele nós nos tornássemos justiça de Deus" (2Cr 5, 21) ele é o Agnus Dei Qui Tolis Peccata Mundi, o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo.

Assim como ele foi pregado no madeiro da cruz, esmagado pelos nossos pecados, também com ele esses pecados foram ali depositados. Mas com sua morte e ressurreição já não mais tivessem o poder de perder as almas. Como cantamos na Vigília Pascal: "Ó pecado de Adão indispensável, pois Cristo o dissolve em seu amor. Ó culpa tão feliz que há merecido, a graça de um tão grande redentor." Assim também nosso pecados foram dissolvidos na cruz, pois "cancelando o documento escrito contra nós, cujas prescrições nos condenavam, aboliu-o definitivamente, ao encravá-la numa cruz." (Cl 2, 14) cabendo agora a cada um de nós aceitar essa salvação pela cruz de Cristo e fazer dela nossa própria cruz, através de nossa conversão.

Quando aceitamos então essa conversão, embarcamos num oceano de águas turbulentas, verdade, mas se nos deixarmos guiar por Deus, poderemos superar a tempestade se invocarmos a presença de Jesus, como fizeram os apóstolos ao sentirem medo. Ao invocarmos seu santo nome, ele nos liberta de nossos medos, de nossas angústias e das seduções de Satanás que nos afastam dele. Assim, podemos, cada um de nós, declarar: "Hoje livre sou!"

Já estamos em alto mar, não há mais como voltar atrás, e as batalhas serão difíceis, mas com a coragem de filhos e filhas de Deus podemos abandonar nossos barcos nas praias e seguir em frente, sem desistir, convidado Nosso Senhor a estar conosco cada vez que duvidarmos de sua presença, devido as dificuldades da vida. Ele certamente não nos decepcionará, pois quem já fez essa experiência, nos garante: Deus não desampara quem a ele se confia, pois "poderia uma mulher, de seu filho se esquecer? E ainda que isso acontece, eu não haveria de te esquecer." (Is 49, 15-16).  Pois "E agora, eis o que diz o Senhor, aquele que te criou, Jacó, e te formou, Israel: Nada temas, pois eu te resgato, eu te chamo pelo nome, és meu." (Is 43, 1)

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